"As cidades foram construídas para que as pessoas pudessem estar mais próximas umas das outras" dizia o tal sociólogo, acrescentado que ironicamente o que se passa é o oposto, ou seja, nas cidades as pessoas vivem, mais do que nunca, afastadas umas das outras. Se não me engano até se deu ao trabalho de comentar qualquer coisa sobre vizinhos que não se querem cruzar com outros vizinhos no elevador.
Eu confesso que até gosto desta coisa de não ter de andar para aí com "bom dia", "boa tarde" e mais um sorriso forçado aqui e outro ali, sobretudo quando ainda não tomei café. Sim, é mais fácil para os mal dispostos viver na cidade e eu sou, por norma, uma mal disposta. Também é mais fácil para quem não gosta de conduzir e quer ir ao cinema, ao teatro, ver uma exposição e comer comida nepalesa, goesa, italiana, ou mexicana, tudo na mesma semana.
Mas, a exemplo do post anterior, ficam aqui umas dicas sobre o que se pode encontrar na cidade para quem esteja a pensar fazer o inverso, ou seja sair do campo para a cidade.
Dependendo das cidades, naturalmente, o mais provável é que se encontrem tantos camponeses como no campo. A diferença é que os camponeses da cidade, ou têm hortas urbanas, ou enfiam-se nos seus carros de regresso à terra, durante o fim-de-semana, para tratarem das couves e afins.
É provável também que nas cidades se encontrem muitas pessoas em actividades que estão a desaparecer no campo, como fazer malha*, costurar, etc., não só porque há mais pessoas nas cidades, como cada passo há esta necessidade de voltarmos às origens (a humanidade, enquanto for humana, vai continuar a questionar-se de onde vem).
Por fim, nas cidades é muito fácil encontrar quem queira mudar o mundo, lutar pelos nossos direitos, desenhar soluções para os mais diversos problemas, mas dificilmente alguém ajuda outra pessoa a descer o carrinho de bebé de um autocarro ou numas escadas.
*Não tenho a certeza que o tricot seja uma actividade de camponeses, na minha família ninguém sabe tricotar, por exemplo. Talvez por ser matriarcal e a malha ser um coisa de homens. Acho que as camisolas poveiras eram tricotadas pelos homens.
Do campo
30.1.12
Bem sei que ninguém me encomendou sermão, mas gostaria de acrescentar uma ou outra coisinha ao debate campo versus cidade, porque parece que alguns estudiosos vieram para a praça pública falar sobre a relação entre a crise e a valorização das relações humanas. Dizia um sociólogo numa peça jornalística, que apanhei a meio, que as pessoas nas cidades estão mais sozinhas do que as que vivem no campo, porque há um maior sentido de comunidade e interajuda no meio rural, e que as primeiras precisam de aprender algumas coisas com as segundas, designadamente a perceber que todos nós precisamos uns dos outros.
Ora, eu não podia estar mais de acordo com tudo isso, mas não posso deixar de referir alguns exemplos da vida no campo para orientar quem esteja a pensar sair da cidade.
É verdade que os vizinhos trocam entre si couves, batatas, cebolas, entranhas de animais e outras coisas, mas também acontece de ficarem anos sem se falarem (zanga que passa para as gerações seguintes), por causa de um muro erguido mais do que era suposto, ou da fossa que deixa bazar água choca.
Ainda assim é mais evidente a solidariedade entre as pessoas, mas parece-me que isso acontece mais por uma questão de sobrevivência do que valor moral. Lembro-me, por exemplo, de ter de mentir quando dava alguma coisa a alguém na escola (um lápis, ou uma caneta), porque não era suposto. Trazer coisas para casa também não era visto com bons olhos, porque poderia significar uma retribuição.
Depois há a questão da família. A família tem um peso determinante na dinâmica das aldeias. Quando os mais velhos se cruzam com um mais novo, que não reconhecem como sendo dali, perguntam: "tu de quem és?". E se por um lado uma pessoa sente-se parte de uma comunidade, por outro sabemos que o nosso lugar nessa comunidade já foi traçado pelos nossos avós, ou pais.
E assim de repente é isso, se entretanto me lembrar de alguma coisa venho acrescentar. Não precisam de agradecer. Até logo.
Ora, eu não podia estar mais de acordo com tudo isso, mas não posso deixar de referir alguns exemplos da vida no campo para orientar quem esteja a pensar sair da cidade.
É verdade que os vizinhos trocam entre si couves, batatas, cebolas, entranhas de animais e outras coisas, mas também acontece de ficarem anos sem se falarem (zanga que passa para as gerações seguintes), por causa de um muro erguido mais do que era suposto, ou da fossa que deixa bazar água choca.
Ainda assim é mais evidente a solidariedade entre as pessoas, mas parece-me que isso acontece mais por uma questão de sobrevivência do que valor moral. Lembro-me, por exemplo, de ter de mentir quando dava alguma coisa a alguém na escola (um lápis, ou uma caneta), porque não era suposto. Trazer coisas para casa também não era visto com bons olhos, porque poderia significar uma retribuição.
Depois há a questão da família. A família tem um peso determinante na dinâmica das aldeias. Quando os mais velhos se cruzam com um mais novo, que não reconhecem como sendo dali, perguntam: "tu de quem és?". E se por um lado uma pessoa sente-se parte de uma comunidade, por outro sabemos que o nosso lugar nessa comunidade já foi traçado pelos nossos avós, ou pais.
E assim de repente é isso, se entretanto me lembrar de alguma coisa venho acrescentar. Não precisam de agradecer. Até logo.
Inverno
27.1.12
O top da manta de inverno está pronto. Duas conclusões:
1- acho que não foi boa ideia abrir as costuras, como é habitual no patchwork.
2- e acho que não vou usar o enchimento (batting) para acolchoá-la.
Contagem decrescente
27.1.12
Há duas coisas que gostava mesmo de fazer em Londres: ganhar um lugar no First Thursdays Bus Tour (como a escolha é feita electronicamente pode ser que tenha mais sorte do que nos giveaways em que participo e que nunca ganho); e assistir a um espectáculo aqui.
Nódoas negras
25.1.12
Não sei se são muito evidentes as semelhanças entre mim e uma barata tonta, mas posso garantir que existem. Naturalmente estão excluídas quaisquer comparações físicas, porque, na verdade, o enfoque deve ser dado ao adjectivo "tonta".
Não é preciso passar pela experiência de estar todo o dia metida em casa com a(s) criança(s) para saber que é uma vida solitária e, portanto, dada a devaneios do pensamento (sim, os passeios ao jardim até podem ajudar a não pensar no assunto, porque a urgência está em saber que braços usar para segurar num enquanto se tira o outro do baloiço, ou em encontrar uma sanita, de preferência sem os rebordos pejados de merda, para poder sentar a criança), mas o que não se imagina é que eles, os devaneios, aparecem de todos os lados e dispersam-se em vários sentidos.
É por isso que num dado momento estou a pensar que não deveria ser tão exigente comigo própria (quer dizer, os miúdos não me deixam dormir o que preciso, nem tão pouco ter a vida que gostava - sim, são a melhor coisa do mundo, não os trocava por nada, mas convenhamos que não facilitam. Não se pode ler um caralho de um livro à vontade, ou beber uma garrafa de vinho sem pensar duas vezes), como no momento a seguir acho que sou uma "meias de seda", com uma vida praticamente luxuosa e que devia era dar muitas graças.
Ou, então, desato a falar em voz alta, para confirmar que ainda consigo dizer o que penso, ou seja que o que está na cabeça é "falável", mas se o telefone toca, e calha de o ouvir, fico aflita por não ter a certeza de ser capaz de ter uma conversa.
Enfim, não me alongo em exemplos, porque além de não me lembrar de mais nenhum creio que já deu para perceber a ideia.
Há, no entanto, uma coisa curiosa que devo (quero?) referir: tenho várias nódoas negras nas pernas, que não sei de onde apareceram, mas tenho para mim que vieram do cérebro para eu poder ver o efeito de tanta tralha a chocalhar por lá.
Não é preciso passar pela experiência de estar todo o dia metida em casa com a(s) criança(s) para saber que é uma vida solitária e, portanto, dada a devaneios do pensamento (sim, os passeios ao jardim até podem ajudar a não pensar no assunto, porque a urgência está em saber que braços usar para segurar num enquanto se tira o outro do baloiço, ou em encontrar uma sanita, de preferência sem os rebordos pejados de merda, para poder sentar a criança), mas o que não se imagina é que eles, os devaneios, aparecem de todos os lados e dispersam-se em vários sentidos.
É por isso que num dado momento estou a pensar que não deveria ser tão exigente comigo própria (quer dizer, os miúdos não me deixam dormir o que preciso, nem tão pouco ter a vida que gostava - sim, são a melhor coisa do mundo, não os trocava por nada, mas convenhamos que não facilitam. Não se pode ler um caralho de um livro à vontade, ou beber uma garrafa de vinho sem pensar duas vezes), como no momento a seguir acho que sou uma "meias de seda", com uma vida praticamente luxuosa e que devia era dar muitas graças.
Ou, então, desato a falar em voz alta, para confirmar que ainda consigo dizer o que penso, ou seja que o que está na cabeça é "falável", mas se o telefone toca, e calha de o ouvir, fico aflita por não ter a certeza de ser capaz de ter uma conversa.
Enfim, não me alongo em exemplos, porque além de não me lembrar de mais nenhum creio que já deu para perceber a ideia.
Há, no entanto, uma coisa curiosa que devo (quero?) referir: tenho várias nódoas negras nas pernas, que não sei de onde apareceram, mas tenho para mim que vieram do cérebro para eu poder ver o efeito de tanta tralha a chocalhar por lá.
A casa
23.1.12
Foi depois de ver o blog da Xana que disse pela primeira vez em voz alta (e toda a gente sabe que uma coisa falada é diferente de uma pensada) que o meu problema é não viver a casa como ela o faz. Ela, e o Pedro, pensaram e desenharam cada detalhe daquela casa. Construíram um ninho para a família e, garanto, é tão acolhedor como parece.
Não quer dizer que aqui o nosso ninho não seja acolhedor, mas imagino que se eu me dedicasse mais a criar espaços, não só úteis como bonitos, ou tão somente a costurar mais almofadas, mantas e outras coisas para nós, poderia ter uma relação diferente com a minha casa. Mas não, a casa é só a casa, com gavetas a precisarem de ser arrumadas, com cortinas a precisarem de bainhas, com quartos-de-banho a precisarem de ser lavados e um forno a reclamar ser esfregado.
Talvez a casa seja o sítio para onde eu quero regressar em vez do sítio onde tenho de estar, sempre.
As fotos em cima foram tiradas na casa anterior, portanto na segunda que tivemos em Lisboa, e apesar de todos os detalhes (os puxadores da sapateira, na foto de cima, as flores que comprávamos todos os sábados no jardim da Parada, o poema da Bea ao lado da cama, etc.) foi a casa em que menos gostamos de viver (portanto, I rest my case).
P.S e agora, a reler, apercebo-me que é um post incoerente. Nada de novo, pois claro.
Coisas más de Lisboa 2
22.1.12
As coisas más de Lisboa são, provavelmente, as mesmas de outras cidades (e reparem que até agora esta é a segunda, contra oito coisas boas), mas a coisa má que se segue é demasiado má, para mim, porque aconteceu à minha filha.
Aos 10 anos a minha menina foi assaltada. Não lhe roubaram nada, porque ela não tinha nada (por acaso tinha telemóvel, mas o próprio do assaltante, um puto pouco mais velho do que ela, decidiu perguntar-lhe se ela tinha telemóvel, depois de lhe ver a carteira, e ela respondeu que não), mas chegou a casa confusa e assustada e eu só queria apanhar o estafermo, que circulava com dois chupa-chupas na boca, dar-lhe dois pares de bofetadas e dizer-lhe que não é nada bonito o que anda a fazer.
Provavelmente muitos dirão que ela não deveria vir sozinha para casa. Eu prefiro que ela saiba que são coisas que podem acontecer (porque o mundo não é perfeito) e que não se pode viver com medo, mas por dentro sinto-me como se tivesse engolido ácido e só penso nas bofetadas que o rapaz merecia naquele focinho.
Fica, pelo menos, a certeza que tenho uma miúda corajosa como o raio e que não é um estafermo qualquer que nos vai impedir de viver normalmente. Mas se eu apanho esse grandessíssimo cabrão (que provavelmente não é mais do que um miúdo assustado como ela)...
No reino do desenrascanço* a coroa é minha
19.1.12
Não há café. Solução: reutilizar as pastilhas usadas e encontrar no meio uma ainda por abrir.
Não há pensos higiénicos. Solução: usar os absorventes das fraldas (voltarei a este assunto, às fraldas reutilizáveis, dentro de breves momentos. Também poderei voltar aos pensos higiénicos se quiserem mas isso é uma conversa nojenta e com palavras medonhas como menstruação).
*Não fazia ideia que esta palavra era tão conceituada!
O pai
18.1.12
Começou, na semana passada, uma série que a Beatriz nos pediu para ver. Dissemos que sim e ficámos a ver com ela. A certa altura, quando o príncipe da Branca de Neve tem de lutar com os maus para salvar a filha bebé, ela diz: "Eh lá, isto é um pai à Jaime". Eu ri-me porque me ocorreu o mesmo pensamento (deve ter tido alguma coisa a ver com a coreografia dos movimentos, ou assim) e ele riu-se visivelmente babado.
Já disse muitas vezes que só tive mais filhos, depois da primeira, e ainda por cima seguidos, porque encontrei um pai para eles. E quando digo um pai, estou mesmo a dizer pai e não um progenitor.
Um dia todos os pais, ou uma grande maioria, serão como ele e as mães serão...bom, não interessa.
Ele passa o dia embrulhado em siglas e estrangeirismos estranhíssimos e reuniões chatíssimas e outras coisas nada charmosas, para sustentar a família, e vem a correr para casa ajudar nos banhos e jantares dos pequenos, por volta das 18h30. Antes disso, deixa a Bea e o Isaac nas respectivas escolas a caminho do trabalho. Quando é preciso faz as compras no supermercado, com a lista que lhe envio pelo facebook, ou telefona a perguntar se faz falta alguma coisa em casa. Depois do jantar é quase sempre ele que põe a louça na máquina. O aspirador também passa mais vezes pelas mãos dele. Leva-os ao médico à vez e sozinho.
Tenho sorte? Talvez (o Rui Unas diz que não, diz que é atitude), mas eu prefiro acreditar que sou uma princesa que encontrou o seu príncipe, porque sou uma filha-da-puta de uma teimosa que não tem medo de ir à procura do que a faz feliz, apesar do preço a pagar por essa felicidade. Ah, pois, há sempre um preço, não sabiam?
Já disse muitas vezes que só tive mais filhos, depois da primeira, e ainda por cima seguidos, porque encontrei um pai para eles. E quando digo um pai, estou mesmo a dizer pai e não um progenitor.
Um dia todos os pais, ou uma grande maioria, serão como ele e as mães serão...bom, não interessa.
Ele passa o dia embrulhado em siglas e estrangeirismos estranhíssimos e reuniões chatíssimas e outras coisas nada charmosas, para sustentar a família, e vem a correr para casa ajudar nos banhos e jantares dos pequenos, por volta das 18h30. Antes disso, deixa a Bea e o Isaac nas respectivas escolas a caminho do trabalho. Quando é preciso faz as compras no supermercado, com a lista que lhe envio pelo facebook, ou telefona a perguntar se faz falta alguma coisa em casa. Depois do jantar é quase sempre ele que põe a louça na máquina. O aspirador também passa mais vezes pelas mãos dele. Leva-os ao médico à vez e sozinho.
Tenho sorte? Talvez (o Rui Unas diz que não, diz que é atitude), mas eu prefiro acreditar que sou uma princesa que encontrou o seu príncipe, porque sou uma filha-da-puta de uma teimosa que não tem medo de ir à procura do que a faz feliz, apesar do preço a pagar por essa felicidade. Ah, pois, há sempre um preço, não sabiam?
Lucky bastard
17.1.12
Andava eu a cismar na manta de inverno (a da primavera está em andamento e calculo que lá para 2015 estará pronta), que bom, bom era ser com fazendas, quando me caíram estas preciosidades no colo, achadas na rua pela minha vizinha. Eu sei, eu sei sou uma lucky bastard. Uma grandessíssima lucky bastard.
Thank you so much, Ana (a minha vizinha não é inglesa, americana ou de qualquer outra ex. colónia britânica, mas eu preciso de praticar o inglês, como sabem. Sim, a lucky bastard son of a bitch).
Oh, Chesterton, mas os funcionários públicos cresceram e reproduziram-se!
16.1.12
"Alguns reformadores sociais tentam esquivar-se dessa dificuldade, eu sei, por meio de vagas noções acerca do Estado ou de uma abstração chamada Educação,que eliminaria a função parental. Mas isso, como muitas noções de pessoas firmemente científicas, é uma louca ilusão, da natureza de um mero luar. Ela se fundamenta nessa estranha e nova superstição, a idéia de infinitos recursos de uma organização. É como se funcionários públicos crescessem como grama ou se reproduzissem como coelhos. Há, por suposto, um interminável suprimento de pessoas assalariadas, e de salários para elas; e elas responsabilizar-se-iam por tudo o que os seres humanos fazem por si mesmos; incluindo o cuidado com as outras crianças. Mas os homens não podem ter como meio de vida a criação dos filhos dos outros." Daqui.
O fim e o princípio
15.1.12
O cachecol que ofereci ao Jaime no Natal, por acabar, está pronto. Comprei a lã (a beiroa, claro) uma semana antes do Natal, porque tinha decidido que só lhe tricotaria alguma coisa se encontrasse o azul perfeito. E encontrei.
Em baixo o início de um dos quatro quilts que quero fazer este ano, um para cada estação. Já tinha experimentado fazer hexágonos neste cat quilt, como lhe chamei, mas na altura não me apeteceu fazer a coisa como deve ser e em vez de juntar os hexágonos à mão, com o papel, cosi-os na máquina. Acho que me vou meter numa daquelas empreitadas sem fim, mas logo se vê como corre.
Há sensações universais 4
13.1.12
"Sou antes, na verdade, uma velhota que se veste mal, é picuinhas, feia, incompetente, presunçosa, tagarela e fútil."
Virgínia Woolf, Diário, 28 de Setembro de 1926.
Virgínia Woolf, Diário, 28 de Setembro de 1926.
Tetris
11.1.12
Há uns posts atrás falava de como é difícil encaixar-me numa pessoa de quase 40 anos, mas começo a achar que decerto tenho é um problema de encaixe generalizado, sobretudo com esta coisa de me ver de cima como se sobrevoasse os espaços por onde circulo.
Por exemplo, mãe-que-fica-em-casa de três filhos a viver na lapa não sou eu (apesar das grandes semelhanças com o meu cabelo e a vestimenta adrajosa).
Gaja que rói as unhas enquanto planeia o fim-de-semana em Londres sozinha e a road trip a Bordéus com a família, entre o compungida pelos que não têm de dar de comer aos filhos e o estar a marimbar-se, à la senhor dos pentelhos, mas decidida a voluntariar-se em alguma coisa para se sentir melhor consigo própria, sou eu.
Doméstica que planeia fazer rissóis de camarão (fazê-los mesmo e não fritá-los), lasanha e outras receitas que possam ser congeladas e depois de algumas horas na cozinha tem o assunto arrumado, não sou eu.
Doméstica que faz os mesmo planos e que desiste a meio do processo, ou que decide que a lista de ementas é efectivamente útil e portanto há que levá-la a cabo, mas nunca a faz, sou eu.
Designer, ilustradora, arquitecta, ou outro tipo de artista com gosto/talento especial para fazer coisas à mão e com máquinas de costura e fotografá-las de forma espectacular, obviamente não sou eu.
Semi-jornalista com algum interesse por tecidos e artesanatos em geral (lembras-te, Dora?), que decide fazer umas coisas, porque é giro (e sempre é melhor que pôr loiça na máquina) e porque gosta de ver os filhos com mantas, meias, caneleiras e outras coisas que lhe saíram das mãos e não se cansa de ficar, imodestamente, embasbacada com o resultado de algumas delas, mas que de repente, e por nada de especial, já acha que é uma perda de tempo, sou eu.
Acho que o grande desafio para 2012 é tentar encaixar os eus todos nos sítios certos para passar ao nível seguinte.
(P.S uma semana depois do início da creche, o Isaac acorda às 6h30, cheio de pressa, que tem de ir para a escola: "Vamos, vamos, quero ir pá escola".)
A manta do Isaac
9.1.12
Para grande desgosto meu, tenho pouquíssimos tecidos em casa. Ainda não criei o hábito de os ir acumulando porque basicamente não gosto de fazer compras, de espécie alguma, mas especialmente roupa e compras de supermercado.
É verdade que gosto muito de ir à retrosaria, e uma vez lá apetece-me trazer tudo, mas aquilo não é bem uma loja é uma espécie de retiro.
Isto tudo para dizer que a manta feita com os restos que ainda tinha, e que vai aquecer o meu pequeno Isaac na escolinha, mais o saco para guardar os lençóis, estão prontos.
Ele ainda não começou fazer a sesta por lá, mas até agora está tudo a correr muito bem.
É verdade que gosto muito de ir à retrosaria, e uma vez lá apetece-me trazer tudo, mas aquilo não é bem uma loja é uma espécie de retiro.
Isto tudo para dizer que a manta feita com os restos que ainda tinha, e que vai aquecer o meu pequeno Isaac na escolinha, mais o saco para guardar os lençóis, estão prontos.
Ele ainda não começou fazer a sesta por lá, mas até agora está tudo a correr muito bem.
Astros
8.1.12
Numa tarde, que só não foi como outra qualquer, porque tinha sido o funeral do pai de uma querida amiga, e enquanto tomávamos chá, posso ter encontrado a razão para não ter tido o percurso escolar que a minha professora primária auspiciou.
A Xana ofereceu-me os livros de filosofia do 12.º ano, que me tinha emprestado na altura para estudar, com as várias notas que tirei. E entre as coisas que destaquei, e que provavelmente eram as menos importantes para os testes (como "O AMOR é a forma primordial de o homem se relacionar com a realidade. É o fundamento da nova Filosofia", Feuerbach), há uma que nos fez rir às gargalhadas: à frente dos nomes dos filósofos eu escrevi qual o signo deles. Sim, isso mesmo, leram bem. Até eu, que me lembro perfeitamente dessa minha obsessão pela astrologia (as horas que passei na magnífica biblioteca da Póvoa a estudar o assunto), fiquei de boca aberta com esses apontamentos.
Portanto, a quem interessar, ficam a saber que Feurebach era Leão; Marx - Touro; Nietzsche - Balança e Kierkegaard - Touro. Do Hegel não tenho nenhuma nota.
(P.S deve haver poucas coisas tão importantes na minha vida como as minhas amigas de há mais de 20 anos.)
A Xana ofereceu-me os livros de filosofia do 12.º ano, que me tinha emprestado na altura para estudar, com as várias notas que tirei. E entre as coisas que destaquei, e que provavelmente eram as menos importantes para os testes (como "O AMOR é a forma primordial de o homem se relacionar com a realidade. É o fundamento da nova Filosofia", Feuerbach), há uma que nos fez rir às gargalhadas: à frente dos nomes dos filósofos eu escrevi qual o signo deles. Sim, isso mesmo, leram bem. Até eu, que me lembro perfeitamente dessa minha obsessão pela astrologia (as horas que passei na magnífica biblioteca da Póvoa a estudar o assunto), fiquei de boca aberta com esses apontamentos.
Portanto, a quem interessar, ficam a saber que Feurebach era Leão; Marx - Touro; Nietzsche - Balança e Kierkegaard - Touro. Do Hegel não tenho nenhuma nota.
(P.S deve haver poucas coisas tão importantes na minha vida como as minhas amigas de há mais de 20 anos.)
Ou então
5.1.12
tenho uma filha pré-adolescente, um filho na adolescência da infância que começou a creche e outro a deixar de mamar. Ide, ide todos à vossa vida.
Euforia
4.1.12
Não sei, estou em crer que atravesso uma fase ou um bocadinho depressiva, ou um bocadinho escatológica. A primeira não seria novidade, mas é um aborrecimento, porque eu não tenho o QI da Ana Cássia Rebelo. A segunda pode ser mais interessante - e eu chamo-lhe escatológica porque parece que ando a escarrar verdades para os passeios e depois a aninhar-me sobre os escarros para os ver de perto -, mas não sei, por enquanto, para que serve.
O do egoísmo é o que menos me preocupa, porque a bem dizer foi o que me salvou de muitas coisas que eu considero más. Já o escarro se calhar só sirvo para isto anda-me a dar cabo dos nervos, porque quer dizer, eu, e mais 10 biliões de pessoas, nascemos para grandes feitos.
Mas, pronto, quero lá saber que passe os dias a partir o cimento que preparo cuidadosamente, com a dose certa de areia e água, e que despejo em cima dos pés até chegar aos tornozelos. O que me chateia a sério é não estar eufórica com o fim-de-semana que vou passar a Londres, sozinha, daqui a três semanas.
O do egoísmo é o que menos me preocupa, porque a bem dizer foi o que me salvou de muitas coisas que eu considero más. Já o escarro se calhar só sirvo para isto anda-me a dar cabo dos nervos, porque quer dizer, eu, e mais 10 biliões de pessoas, nascemos para grandes feitos.
Mas, pronto, quero lá saber que passe os dias a partir o cimento que preparo cuidadosamente, com a dose certa de areia e água, e que despejo em cima dos pés até chegar aos tornozelos. O que me chateia a sério é não estar eufórica com o fim-de-semana que vou passar a Londres, sozinha, daqui a três semanas.
Creche
3.1.12
O Isaac vai para a creche. Poupo-vos a lengalenga do drama da decisão (que se resume ao facto de eu não me sentir capaz de estar todo o dia em casa, sozinha, com os dois pequenos), mas há alguns detalhes que não consigo deixar de partilhar, para vossa imensa alegria, eu sei.
E não vou falar, por enquanto, desta forma que a sociedade encontrou de encaixar os filhos nas nossas atarefadas vidas; ou de como me sinto uma total falhada por não conseguir cumprir com aquilo que me parece básico para qualquer criança, que é estar ao cuidado da mãe, ou do pai, ou dos avós, até aos três anos, e afinal parece que não vos vou poupar aos meus dramas...não, vou, vou poupar-vos, porque há outras coisas mais importantes, digo eu.
Então é assim, tenho a impressão, ainda que intuitiva, porque não falei com muita gente sobre o assunto, que há dois tipos de creches conceituadas em Lisboa: as religiosas e as da "esquerda caviar". Pessoalmente identifico-me mais com as últimas, mas vivo numa zona em que as primeiras são a maioria, se não as únicas, e para mim o factor proximidade é importante. Naturalmente estas creches (e pré-escolares) são IPSS, porque tanto os católicos como os liberais defendem que todos têm os mesmo direitos, mas nisto, como em tudo, há sempre uns com mais direitos do que outros e por isso as creches seleccionam quem lhes convém para manterem o seu estatuto de conceituadas.
Por isso é que, por exemplo, numa creche da Rua do Patrocínio estava uma fila interminável para pré-inscrição dos meninos que vão entrar em Setembro, e uns metros à frente, noutra rua, uma creche com vagas. Com vagas, com boas instalações, com pessoas simpáticas e uma educadora que me inspirou confiança.
E, pronto, vou ali chorar baba e ranho e fazer-lhe uma manta para se cobrir nas sestas (que podem ser feitas comigo ao lado dele nos primeiros dias) e um saco de pano para guardar os lençóis.
E não vou falar, por enquanto, desta forma que a sociedade encontrou de encaixar os filhos nas nossas atarefadas vidas; ou de como me sinto uma total falhada por não conseguir cumprir com aquilo que me parece básico para qualquer criança, que é estar ao cuidado da mãe, ou do pai, ou dos avós, até aos três anos, e afinal parece que não vos vou poupar aos meus dramas...não, vou, vou poupar-vos, porque há outras coisas mais importantes, digo eu.
Então é assim, tenho a impressão, ainda que intuitiva, porque não falei com muita gente sobre o assunto, que há dois tipos de creches conceituadas em Lisboa: as religiosas e as da "esquerda caviar". Pessoalmente identifico-me mais com as últimas, mas vivo numa zona em que as primeiras são a maioria, se não as únicas, e para mim o factor proximidade é importante. Naturalmente estas creches (e pré-escolares) são IPSS, porque tanto os católicos como os liberais defendem que todos têm os mesmo direitos, mas nisto, como em tudo, há sempre uns com mais direitos do que outros e por isso as creches seleccionam quem lhes convém para manterem o seu estatuto de conceituadas.
Por isso é que, por exemplo, numa creche da Rua do Patrocínio estava uma fila interminável para pré-inscrição dos meninos que vão entrar em Setembro, e uns metros à frente, noutra rua, uma creche com vagas. Com vagas, com boas instalações, com pessoas simpáticas e uma educadora que me inspirou confiança.
E, pronto, vou ali chorar baba e ranho e fazer-lhe uma manta para se cobrir nas sestas (que podem ser feitas comigo ao lado dele nos primeiros dias) e um saco de pano para guardar os lençóis.
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