A solidão

28.1.11
Eu sabia que ia dar de caras com sofrimento; sabia que ia ver rostos que me iriam perseguir; sabia que corria o risco de a qualquer momento chorar descontroladamente. Sabia, porque das outras vezes que me cruzei com o trabalho deste gajo foi isso que aconteceu (não tanto neste  Happy-Go-Lucky). O que eu não sabia era que ia encontrar um bocado de todos nós (de mim e todos os que conhecemos) ali, a olhar para mim, a mostrar-me a nossa vida tal qual é se estivermos a olhar para ela. Uma dureza!

Da maternidade 3

28.1.11
Ao responder às perguntas de uma jornalista que está a fazer uma peça sobre mães que ficam em casa (e por falar em peça ocorre-me que a costura tem tudo a ver com o jornalismo) percebi porque me custa tantas vezes viver com a opção que tomei. É que cuidar dos filhos, amando-os incondicionalmente e fazendo o que é melhor para eles e não para nós, é uma coisa tão básica que até uma mãe gorila faz. E bem.

Há sensações universais 2

25.1.11
No dia 25 Outubro (primeiro dia da hora de Inverno), de 1920, Virginia Woolf escreveu no diário o seguinte: "É que não tenho filhos, vivo afastada dos amigos, não consigo escrever bem, gasto muito dinheiro em comida, envelheço - dou demasiada importância aos quê e porquês; dou demasiada importância a mim mesma."
Ora, no dia 25 de Janeiro de 2011, eu podia dizer exactamente o mesmo, tirando a parte do não ter filhos.

Umbigo

24.1.11
Tirando essa coisa ternurenta do Isaac oferecer bolachas ao Nicolau, esmagando-as contra o meu umbigo (suspeito que ele acha que é o umbigo que se chama Nicolau), a gravidez chegou àquela fase aborrecida. Sim, a gravidez, no geral, é um aborrecimento mas esta estava a passar bastante despercebida. Agora, ele é cãibras na barriga, ele é os ilíacos a gemer toda a noite, ele é o sono a apoderar-se novamente de todo o meu ser...Ainda assim é a gravidez que tenho menos pressa que termine. Não só porque, em princípio, será a última, mas sobretudo porque a ideia de ter dois bebés em casa começa a parecer-me um bocado assustadora.

19º Presidente da República

24.1.11
Fui votar pela primeira vez em Lisboa e, coisa estranha, é exactamente igual a ir votar no Porto ou noutro sítio qualquer (e eu tenho cartão de cidadão). Senti o mesmo nervoso miúdinho, a mesma solenidade do momento em cada passo, neste caso, até à 14.ª secção de voto, a mesma sensação de dever/direito cumprido, que senti em todas as eleições em que fui votar. Por isso, quando abstive-me nas últimas legislativas fi-lo com a intenção de mostrar o meu total desapontamento com os políticos e o sistema que representam, mas fiquei sempre na dúvida se teria feito o mais acertado. Agora tenho a certeza. Não vale de todo a pena. Este país merece os políticos que tem e merece a merda em que está atolado. Mas, pronto, "bem aventurados os pobres de espírito, porque deles será o reino dos céus".

P.S1 Confesso que a única coisa que me surpreendeu no meio disto tudo foi o discurso do Pedro Passos Coelho. Incrível a ascensão do marketing político em Portugal!

P.S2 Mas que sei eu? sou apenas uma pobre doméstica.

P.S

21.1.11
E a Virginia tem piolhos.

Das coisinhas do dia-a-dia

21.1.11
Não sei como dizer isto, tendo em conta não só a enormidade da façanha, como a tremenda relevância do assunto, mas aqui vai: Consegui aspirar a casa. Assim, sem mais. Demorei duas manhãs mas está feito. Prontíssimo para voltarmos ao mesmo daqui a uns dias.
E se houver por aí alguma senhora grávida, e a cuidar de um bebé de 15 meses, que faça isto todas as semanas, ou a cada quinze dias, e que ainda venha ler blogs, que fique caladinha, sim? Porque eu também não me vou gabar de ter desentupido os canos do quarto-de-banho (vai-se a ver e eu devia era ser picheleira) e ainda deixá-lo a brilhar de limpo.

26 semanas

18.1.11
Em certas e determinadas ocasiões, em que ainda sinto a episiotomia anterior, ocorre-me que tenho de passar por outro parto.

Coisas de que desisti*

14.1.11
  • Ficar em casa com a Bea durante os primeiros três anos de vida dela (16 meses)
  • Monitora de uma exposição permanente no Museu dos Transportes e das Comunicações na Alfândega do Porto (um ano)
  • Vegetariana (dois anos)
  • Curso de Sociologia (um semestre)
  • Casamento (14 meses)
  • Account numa agência de comunicação (um mês)
  • Jornalista (10 anos)
  • Curso de escrita criativa (dois meses)
Eu sempre achei que muitas vezes é preciso mais coragem para desistir do que para continuar numa situação que não nos interessa mas, foda-se, começo a achar que sou é uma falhada do caralho!

*desde 2001, ou seja, desde que fui mãe pela primeira vez.

Da maternidade 2

14.1.11
Aqui há dias cruzei-me com uma amiga de uma amiga que ao ver-me grávida outra vez exclamava meia incrédula: "Incrível, mas tu nasceste para isto!" E eu a olhar para ela e a dizer "vê lá tu que eu pensei que vinha para Lisboa catapultar a minha carreira e afinal não faço mais nada a não ser parir" (não deve ter sido bem com estas palavras, porque eu nunca digo catapultar) e ao mesmo tempo a pensar "nasci? eu não acho grande piada a isto, eu nem sei bem o que é isto".
E depois, claro, fiquei a matutar nisso, como já não o fazia desde os tempos em que gritava à minha mãe "EU NÃO PEDI PARA NASCER" e batia com as portas e apanhava no focinho.
Ora, segundo ela, a minha mãe, eu nasci, como toda a gente, para sofrer e depois ser feliz na outra vida, na que é eterna. Eu tenho sérias dúvidas que algum dia venha a descobrir para que nasci, ou a conseguir explicar porque sempre quis ter filhos, mas quando penso nisso mais profundamente chego a algumas conclusões que, altruisticamente, passo a partilhar:

1) Ter filhos com alguém é uma prova de amor.
2) São a única coisa de definitivo que tenho na vida. Serei para sempre mãe deles, mesmo depois de morta.
3) São a melhor parte de mim.
4) Não sou melhor pessoa por ser mãe.
5) E, então, enquanto cuidadora deles a tempo inteiro sou mesmo uma pessoa fastidiosa, intratável, mesquinha, aborrecida, deprimida e chata.
6) Posso até ser boa mãe, que me parece que sou, mas não posso dizer o mesmo sobre ser uma boa educadora.

E é isso.

Estou doente

12.1.11
E afinal não resisti desta vez. Tenho uma faca espetada nas costas. Ando a espalhar ranho pela casa e a cabeça vai explodir dentro em breve. Na verdade não é assim tão diferente dos resto dos dias, à excepção do ranho, mas assim como assim posso dizer que estou doente e não grávida. Aliás, posso dizer que estou doente e grávida!!! Até fiquei cheia de pena de mim própria, agora, ou com mais pena de mim própria do que é habitual, pronto.

Amanhã é outro dia

10.1.11
Enquanto a febre ataca novamente a família, e eu quase me convenço que tenho uma doença que me tem impedido de ficar doente, ponho-me a pensar que deveria ter um qualquer projecto com deadlines e objectivos a cumprir para ver se me torno numa pessoa melhor (isto porque vi o filme da moça que decidiu cozinhar as receitas da Julia Child e relatar a experiência num blog. Entretanto a Julie tornou-se escritora e mantém este blog com um "Drinking Diaries" que estou mortinha por ler).
É claro que eu poderia encarar a educação dos pequenos (mais o nascimento do terceiro) como um "projecto" e estabelecer objectivos, planear brincadeiras, organizar os quartos deles ao pormenor, tricotar-lhes roupinhas e afins, mas não. Ou a casa: fazer listas (por acaso há uma colada no frigorífico) do que falta fazer e ir riscando, mas não. A horta, podia dedicar-me à permacultura, por exemplo, mas não. Arrasto-me pela casa com o Isaac a tiracolo, espreito o congelador para planear o jantar (sopa+filetes de pescada+arroz de ervilhas), chuto os brinquedos para o lado, empurro a roupa suja para dentro do cesto a transbordar e espero por amanhã.

Aviso

5.1.11
A quem interessar devo avisar que estou um bocado obcecada com a Virgina Wolf.
Depois de rever  As Horas pendurei-me nas estantes novas à procura do “Mrs Dalloway” e como só encontrei a versão original (devo-o ter comprado num acesso de optimismo, porque ler noutras línguas é mais bolos) optei por pegar no livro que deu origem ao filme, mais uma biografia escrita por Monique Nathan e As Cartas Íntimas a Vita Sackville-West.
Portanto, caso eu não recomece a costurar e a tricotar brevemente, é possível que este blog se torne muito repetitivo.

P.S1 Para ficar registado, e atestar a minha obsessão, devo dizer que li ainda Um quarto com Vista, de Edward Morgan Forster, só porque era um Bloomsbury.

P.S2 Fui confirmar e no ano passado li sete livros (?!?!?), que miséria!

O que interessa

4.1.11
Uma pessoa anda a passarinhar pela vida, no meu caso ligeiramente anémica e violentamente mal penteada (eu já devia saber que não há corte de cabelo que me salve) sem saber ao certo que desvio, rampa, escadaria a trouxe até aqui (ainda que eu tenha uma certa tendência para me gabar de conseguir chegar ao resultado com a soma de todas as escolhas que fiz) e de repente apercebe-se que, independentemente dos amantes que teve, dos filhos que gerou, dos mortos que enterrou, das alegrias e tristezas que viveu, o que lhe interessa mesmo, o que a deixa verdadeiramente transtornada, é começar a chover quando a roupa está no estendal quase seca.

No circo

2.1.11
Fui ao circo. Não sei até quando resistirá este espectáculo obsoleto, em que os trapezistas voam no ar e a seguir vendem bandoletes que piscam e desmontam cenários, mas enquanto resistir continua a despertar, no meio de muitos sentimentos contraditórios, uma certo encantamento. Talvez seja uma reminiscência do meu plano falhado para fugir com o circo que montava a tenda no terreiro em frente a minha casa. Acho que a única pessoa que suspeitava do meu plano era o rapaz palhaço por quem me enamorei, apesar de não gostar de palhaços, e que acabou por morrer, uns meses depois de desmontarem a tenda lá do sítio, por causa de uma cerveja gelada. Fiquei chocada e lembrei-me da terrível dor de dentes que teve de esquecer durante uma matiné - mas que o obrigou a pedir ao meus tios que o levassem ao hospital à noite -, como se acreditasse que depois daquilo a vida lhe fosse correr melhor. Mas não, morreu.
Agora já não planeio fugir com o circo. Tiro fotografias aos pequenos com o leão bebé.