Improviso

27.2.15
De manhã vieram os dois deitar-se na minha cama.
- Hoje há escolinha, perguntou o Isaac
- Sim mas se quiserem podem ficar em casa, querem?
- Siiiiiiiiiiiiiiiiiiiim

De maneiras que agora vou ali preparar um piquenique.

A vida pula e avança

26.2.15
No espaço de seis meses três amigas minhas separaram-se. Três amigas que andam às voltas com angústias e mágoas e algum alívio. Nesse mesmo espaço de tempo, uma outra amiga foi mãe e outra engravidou de gémeos.
Uma pessoa, que tem como ponto alto da sua vida a separação do DIU (à terceira tentativa), até fica ourada.

Futilidades

25.2.15
Acabei de abrir o e-mail da Epal com a conta da água. Diz que vou pagar mais de saneamento e resíduos sólidos do que de consumo da água. Assim de repente parece-me completamente justo, porque a água, bem vistas as coisas, até devia ser grátis, como o sol e o ar (por enquanto), mas tratar dos resíduos é toda uma outra ciência.
Só que vai-se a ver e, às tantas, isto é tudo uma questão de perspectiva, de interpretação. Uma questão de saber ler (não como os analfabetos funcionais sabem) nas entrelinhas (não como os astrólogos).
Passa-se o mesmo quando se pede ao cidadão comum - que é aquele que, como toda a gente sabe, tem conhecimentos em Ciência Política, Estudos Europeus, Relações Internacionais, Economia e Estatística - que perceba claramente os diferendos entre Eurogrupo*e Grécia, por exemplo.
Enfim, um dia destes o meu sobrinho vai explicar-me tudo muito bem, enquanto isso vejo séries. As séries de médicos e as de grupos de amigos são definitivamente as melhores. 

*Um dia destes ainda me hão-de explicar, talvez à luz do darwinismo social, o que é isto ao certo.

Finalmente

25.2.15
Temos um génio na família. O meu sobrinho de 7 anos, o filho mais novo da minha irmã, tem um Q.I de 158. Eu sabia que nos nossos genes corre uma certa inteligência*.

É impossível provar-se a hereditariedade da genialidade mas isso agora não interessa nada.

Há sensações universais 10

23.2.15
"Talvez que, à medida que se vai andando, se aprenda alguma coisa. A mim não me interessava o que isso seria. Só queria saber como viver nisso. Talvez que, uma vez sabido como viver nisso, se acabe descobrindo o que isto tudo é."

Ernest Hemingway, O Sol Nasce Sempre (Fiesta), Livros do Brasil, 1996

Um dia de domingo.

23.2.15
A revista do Público fez um especial sobre alimentação. É o tipo de trabalho jornalístico que me encanta (ler com pronúncia galega, porque sim). Li todos os textos de enfiada e no fim não me apeteceu seguir nenhuma das dietas em particular, apeteceu-me seguir todas. Gostei muito de ler sobre o glúten, sobre a lactose e a lactase, os crudívoros e os "paleos" mas depois tive de levar com um recado do Universo, essa entidade irónica, que escolheu precisamente o domingo para me dizer que em vez de estar preocupada com o que ingerimos devia era preocupar-me com o que resta, depois da digestão. Isso mesmo, estamos a falar de merda.
Mas porquê? porquê? perguntam vocês. Porque, caras pessoas, uma das sanitas cá de casa entupiu e de cada vez que alguém puxava o autoclismo na outra sanita, a água e outras substâncias que não precisam de descrições iam ter ao poliban (que raio de palavra) do WC, cuja sanita está entupida.
Sim, foi um domingo divertido

Não é bem uma conclusão

18.2.15
Gosto muito de viver nesta época. Cada vez que penso nisso chego à conclusão de que viver nesta época é mesmo muito bom, temos antibióticos, anestesias e aviões que nos levam para paraísos longínquos e que contribuem para a destruição dos mesmos mas isso agora não interessa nada, temos também uma coisa chamada internet que nos leva para onde queremos e não queremos ir. 
Mas o que esta época tem de mais interessante é a forma como se vive a maternidade/paternidade nos dias de hoje. Os filhos podem andar atrelados aos pais sem que isso seja visto como uma coisa de pobres. 
Mães que ficam em casa a cuidar das suas crias e que as penduram em slings já não são as mesmas desgraçadas que passavam dias inteiros nos campos com as crianças metidas em cestos, são mães modernas que fizeram uma escolha. Mesmo as que não podem fazer essa escolha fazem das tripas coração para passar tempo com os filhos, proporcionar-lhes momentos de afecto, entre banhos e jantares e trabalhos de casa. 
E para quê, pergunto eu? Porquê tanto empenho na educação de uma criança? Acabamos todos fodidos da cabeça na mesma, afinal. 

Reformada

16.2.15
Plantei bolbos de frésias e semeei tomilho. Terminei as duas fantasias, uma de super herói e outra de vilão. Mudei objectos decorativos de sítio e lembrei-me de onde vieram e porquê. Bebi uma garrafa de vinho e deixei o livro em cima do banco que faz de mesinha de cabeceira por abrir.
Acho que já sei o que responder quando me perguntarem "o que faz". Direi: sou reformada.

Romance

13.2.15
Foi há mais de 14 anos. Lembro-me que fui ver o filme ao Nun'Álvares a meio da tarde, que é para mim a melhor altura para se ir ao cinema. Lembro-me de duas cenas do filme - um minete nas escadas e do sonho do bordel, em que Marie tem a parte de baixo do corpo separada da parte de cima por uma cortina, ou um plástico. Curiosamente, não me lembro do parto, não me lembro de ela ter sido mãe, o que torna ainda mais estranho ter escolhido este filme para a minha versão de "pornografia para mamãs".

Imprensa

13.2.15
A Ana Cássia Rebelo está no ípsilon. Acho que o Hugo Pinto dos Santos, que assina o texto, está apaixonado por ela. É compreensível.
Vou comprar o livro, claro, mas suspeito que vou sempre gostar mais da autora do que da obra, ou pelo menos gostar tanto da obra como da autora.

Eureka

11.2.15
Almoço todos os dias em casa, salvo raras excepções. A maior parte das vezes como restos do jantar, ou então cozinho qualquer coisa rápida, como uma omolete, ou uns legumes salteados com noodles. Mas hoje não foi esse o caso. Hoje, saí na esperança de comer rissoto no café perto de casa só que tive de me contentar com um arroz de legumes e bife de frango crocantes. Estava bom.
Comi, li sobre as melhores sopas na Time Out e levantei-me para guardar a revista no sítio e pagar. O senhor que me tinha atendido perguntou: "já? anda sempre a correr" e sorriu. Retribui o sorriso e compreendi tudo (quer dizer, ainda não cheguei ao sentido da vida, obviamente, mas diz que não é suposto). Ou seja, compreendi que me sobra tempo, porque faço tudo demasiado rápido. Tão simples quanto isso.

Agastada

10.2.15
Estava a ouvir a entrevista da Matilde Campilho no "Fala com ela", da Inês Meneses, e enchi-me de quase ódio, só não cheguei lá, ao ódio, porque estou demasiado agastada para sentimentos desse calibre. 
Ali estava a voz dela a sair pelas colunas do rádio como se fosse água cristalina de um ribeiro, tanta frescura, tanta jovialidade, tanta vida e eu ali dentro do carro, no lugar do morto, com dores de costas, rugas de preocupação na testa e três putos sentados no banco de trás, dois deles a gritar que queriam ouvir o Richard Cheese.
Não conheço muito bem a poesia da moça mas aposto que é como ela. Talvez ela seja a poesia em vez de a poeta. Não sei, não faço ideia. Sei que me irrita.
Se não fosse o Richard Cheese muito provavelmente ter-me-ia afogado naquela voz de água. 

Acordar

6.2.15
Deixei-me estar na cama deles (foi uma daquelas noites de troca de camas), depois de saírem com o pai, que os vestiu e os levou à escola. É cada vez mais raro não conseguir levantar-me mas ainda acontece.
Antes de abrir os olhos tomo consciência da minha "exuberante calcificação do tendão supra-espinoso com cerca de 14mm" que tem feito a vida negra ao meu ombro e braço direito. Sinto o mau hálito ao engolir saliva cheia de peptococcus e outras bactérias e confirmo que uma das amígdalas, a direita, continua dorida. Viro-me de lado e deixo que a mão direita repouse sobre a barriga macia, sobre a barriga flácida a cair em direcção ao colchão. Todos os ossos do meu corpo pedem que saia da cama mas os músculos não querem obedecer, as ordens que recebem são confusas.
Depois, o Isaac vem dar-me um beijo e, antes de sair, abre as persianas. O sol entra no quarto e a escuridão dá lugar a um nevoeiro cor de laranja. Viro-me de barriga para cima e abro os olhos devagarinho, fico durante algum tempo a ver as minúsculas formas no ar, como se estivesse a ver células num microscópio e decido que tenho de me levantar.

Pessoas descompensadas

4.2.15
Foto de Pedro Santos

A C. do Lifecooler mal viu que eu tinha regressado ao blog (sou uma pessoa tão pouco consistente, valham-me os deuses) pediu-me um texto sobre teatro com urgência.
Eu não conheço bem a C., só almoçamos juntas três vezes, mas gosto dela. Aparenta ser uma pessoa equilibrada e acho que é por isso que estar com ela é muito reconfortante. Não que eu seja desequilibrada, simplesmente não consigo manter um emprego durante muito tempo, nem o próprio negócio durante muito tempo e desisto a meio de quase todos os meus projectos.  
E o que é que isso tem a ver com o teatro? Ora, provavelmente nada mas a relação que fiz na minha cabeça foi a de que pessoas como eu, que gostam muito de teatro e que podem ir ao teatro não vão assim tantas vezes ao teatro. Aliás, fazem poucas coisas que realmente gostam e depois azucrinam as pessoas à sua volta, porque são umas injustiçadas, coitadas!
E já que estou numa de autocomiseração decidi contar as vezes que fui ao teatro nos últimos tempos (ah, nunca duvidar da utilidade de um blog):

- Quizoola Lisboa! dos Forced Entertainment
- Noite do Manifesto 
- As Criadas, encenação de Luc Bordy
- Durações de Um Minuto de Clara Andermatt e Marco Martins
- O Ginjal ou o Sonho das Cerejas, encenação de Mónica Calle

Pois, basicamente, é vergonhoso! Mesmo que me tenha esquecido de alguma peça, isto dá pouco mais de uma ida ao teatro por ano. Tenho mesmo de equilibrar isto e ir ver, pelo menos, três peças de teatro seguidas, ou então posso esperar por Julho e ver todas as peças do Festival de Almada, onde já fui muito feliz.
Também podia escrever uma peça de teatro (mesmo que seja para desistir passado três páginas), ou ganhar coragem de uma vez por todas e fazer teatro amador. Se calhar até nem corria muito mal, é que diz-se por aí que os actores são pessoas descompensadas.

A realidade

2.2.15
Acabou Janeiro e começou Fevereiro e eu, juro, achei mesmo que não ia retomar o blog. Primeiro, porque acreditei que seria uma pessoa mais livre sem sentir a obrigação de postar. Depois, por acreditar veementemente que não tinha nada de novo, ou interessante, a acrescentar ao mundo.
Acontece que, além de não estar a conseguir escrever "cenas" para sei lá eu o quê, apercebi-me que me sinto muito menos livre a obrigar-me a não escrever do que o contrário e que, apesar de continuar a não ter nada de novo a acrescentar, preciso de um sítio onde possa dizer que faço caretas e danças estúpidas ao espelho só para confirmar que pareço uma giga com braços e pernas.
Eu tentei falar sobre isto num serão familiar, em Gouveia, no fim-de-semana que passou, mas só consegui olhares de espanto, para meu próprio espanto já que tenho uma filha adolescente e tudo. Quer dizer, é normal fazerem-se coisas estúpidas ao espelho, tipo treinar linguados quando temos 12 anos, certo? Até concedo que fazer danças parvas para ver a barriga e os músculos do adeus a tremerem seja uma coisa relativamente estranha mas, pelo menos, aqui posso dizer isto sem ver os esgares de coitada-ela-tem-mesmo-problemas.