Apontamentos de Banguecoque
Coisas da gaveta
Fiquei a saber que se tratava de uma senhora que se sentiu mal dentro do autocarro. Era o 708, que circula entre o Martim Moniz e o Parque das Nações Norte.
Segui o meu caminho a imaginar o que teria acontecido à mulher. Teria sido um enfarte? Estaria cheia de sacos do supermercado, como estão sempre as mulheres que parecem prestes a ter uma paragem cardíaca, enquanto sobem a rua a arfar? Os números dizem que a maioria das vítimas de enfarte são homens mas a mim parece-me sempre que são as mulheres que andam com o coração prestes a ser esmagado.
Eu também estava com sacos de compras nas mãos e parei em frente a uma montra à procura de vestígios de um quase enfarte no meu reflexo, mas lá estava a minha cara de sempre, sem qualquer interesse. Irritou-me olhar para mim. Acontece-me muitas vezes. Creio não ser a única pessoa no mundo a irritar-se com o seu próprio focinho reflectido num vidro.
Os miúdos estão crescidos
A minha avó
O pior de estar tão longe
Oh, avó...
Medo
Tivemos de despedir a Ana e obviamente teve de ser o Jaime a tratar desse assunto, porque eu sei que seria incapaz. Fui ao yoga, enquanto ele, coitado, falou com ela.
Agora, temos cá a Domingas. A Domingas é uma querida e eu estou a tentar ensiná-la a cozinhar. Corre tudo bem até chegarmos à parte em que é preciso acender o fogão. Nessa altura fica em pânico e diz, com os fósforos na mão, "Domingas não consegue". A Domingas nunca viu um fogão a gás e, naturalmente, aquilo mete-lhe medo.
Evolução das espécies
Imagem retirada daqui
Fiquei com vontade de saber coisas sobre Empédocles, mas não tinha internet para ir ao google.
Entretanto, já com uns quantos gigabytes comprados na Timor Telecom, abro o facebook e dou de caras com o "A Morte de Empédocles", de Hölderlin.
E depois de alguma pesquisa fiquei a saber que Empédocles tem uma teoria da evolução bastante curiosa. "Para ele no princípio havia numerosas partes de homens e animais - pernas, olhos, orelhas - que estavam distribuídas desordenadamente. Através do amor essas partes se juntavam aleatoriamente formando criaturas disformes que eram inviáveis para sobreviver e pereciam. As espécies que formavam uma boa combinação sobreviviam."
Linguagem desconhecida
O meu telemóvel está a tentar comunicar comigo numa linguagem desconhecida. Eu ia fotografar um cacho de bananas que cresce a olhos vistos no lado certo da árvore (isto dependendo da perspectiva, claro, uma vez que a bananeira está no jardim do vizinho e este cacho cresce dentro do meu quintal), mas as únicas imagens que o meu telefone consegue captar são como a que se vê ali em cima.
Pensei que era por causa dele ter caído ao chão, mas depois desse acidente já conseguiu captar o Isaac vestido de pai, um mudra que nunca tinha visto e o tangram novo do Nicolau.
Por isso, acredito mesmo que o meu telemóvel esteja a ser usado para um tipo de comunicação desconhecida, até porque há coisas bastante fora de série no universo (e no meu telemóvel, como um mudra e um tangram lado a lado)
Se calhar sou eu a tentar comunicar comigo, a partir de um wormhole, como o Matthew McConaughey.