Do campo

30.1.12
Bem sei que ninguém me encomendou sermão, mas gostaria de acrescentar uma ou outra coisinha ao debate campo versus cidade, porque parece que alguns estudiosos vieram para a praça pública falar sobre a relação entre a crise e a valorização das relações humanas. Dizia um sociólogo numa peça jornalística, que apanhei a meio, que as pessoas nas cidades estão mais sozinhas do que as que vivem no campo, porque há um maior sentido de comunidade e interajuda no meio rural, e que as primeiras precisam de aprender algumas coisas com as segundas, designadamente a perceber que todos nós precisamos uns dos outros.
Ora, eu não podia estar mais de acordo com tudo isso, mas não posso deixar de referir alguns exemplos da vida no campo para orientar quem esteja a pensar sair da cidade.
É verdade que os vizinhos trocam entre si couves, batatas, cebolas, entranhas de animais e outras coisas, mas também acontece de ficarem anos sem se falarem (zanga que passa para as gerações seguintes), por causa de um muro erguido mais do que era suposto, ou da fossa que deixa bazar água choca.
Ainda assim é mais evidente a solidariedade entre as pessoas, mas parece-me que isso acontece mais por uma questão de sobrevivência do que valor moral. Lembro-me, por exemplo, de ter de mentir quando dava alguma coisa a alguém na escola (um lápis, ou uma caneta), porque não era suposto. Trazer coisas para casa também não era visto com bons olhos, porque poderia significar uma retribuição.
Depois há a questão da família. A família tem um peso determinante na dinâmica das aldeias. Quando os mais velhos se cruzam com um mais novo, que não reconhecem como sendo dali, perguntam: "tu de quem és?". E se por um lado uma pessoa sente-se parte de uma comunidade, por outro sabemos que o nosso lugar nessa comunidade já foi traçado pelos nossos avós, ou pais.
E assim de repente é isso, se entretanto me lembrar de alguma coisa venho acrescentar. Não precisam de agradecer. Até logo.

3 comentários:

  1. Vila também conta? A minha mãe tem o maior grupo de amigas que conheço. E são unidas. Zangam-se? Sim. Cuscam? Sim. Mas apoiam-se e borgam forte e feio, em jantares, passeios, lanches domingueiros, aniversários. Pq cresceram juntas. Eu moro numa zona que não é minha, não sou de parte alguma, tenho amigos dispersos, poucos aqui, não me sinto parte da comunidade. A crise veio-nos meter a todos para dentro. As distâncias dão trabalho. E os filhos. Eu às vezes queria morar na minha vila e estar sempre de cabeça encostada ao ombro de alguma amiga. E rir muito. Ok,. não teve nada a ver para a reflexão, mas os meus melhores tempos foram lá, bem no interior, onde tudo acaba por chegar. (e depois tenho a parte em que adoro as cidades, por causa das praças, das livrarias, das esplanadas, dos monumentos, dos centros históricos).

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  2. apressado ou não é sempre um bom português, o teu. Vilas não contam, porque as vilas são a síntese das duas coisas e por isso são perfeitas, ou quase, pronto.

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