Comunidades criativas

31.5.13
O imaginário colectivo é um conceito que desde sempre me intrigou. Esta coisa de um grupo de pessoas fazer a mesma coisa, num mesmo espaço de tempo e, muitas vezes, em diferentes partes do mundo é, temos de admitir, genial.
Parece, por exemplo, que na mesma altura em que Marconi andava a inventar a telegrafia sem fios (TSF), em Itália, faziam-se transmissões idênticas um pouco por todo o mundo: Alexander Popov, na Rússia; o Padre Landell de Moura, no Brasil e Nikola Tesla, um emigrante croata, nos EUA. Isto por volta de 1895, quando não havia facebook, portanto.
Ora, a mim parece-me que neste momento estamos a assistir a uma nova tendência, da qual por acaso (ou não) eu faço parte, que, não sendo tão revolucionária como a TSF, muito provavelmente vai marcar pontos no mercado de trabalho. Refiro-me às comunidades criativas que surgiram entretanto e que têm em comum juntarem modos de vida de outros tempos com ideias novas. Há muita gente a fazer isto, há muito tempo, o que é novo é o colectivo, acho eu. Como se tivéssemos percebido, finalmente, que juntos vamos mais longe. É o caso deste projecto, deste e do nosso. Por falar nisso, a loja está aberta.

Carrossel dos cavalinhos

29.5.13
A minha primeira experiência como trabalhadora por conta de outrem, depois de um período de quatro anos em casa, termina esta semana.
Nada garante que daqui a umas voltas não saia da roda do carrocel dos cavalinhos, que é a minha vida, (espero que não em andamento, como aconteceu, de facto, em tempos) mas até lá vou estar a cem por cento na Oporto Lobers, vou ver uma ou outra sessão de cinema a meio da tarde, vou almoçar sopa da pedra às sextas-feiras, vou voltar a andar de eléctrico todos os dias com os meus meninos, excepto quando ficar em casa com eles sempre que me/lhes apetecer.

Sorrisos parvos

29.5.13
Fala-se muito na relação entre os irmãos, quando se tem mais do que um filho, e é de facto bonito assistir a determinados momentos, mas o que me deixa estupefacta aqui em casa é a relação do Isaac com o pai. Aquilo que eles sentem um pelo outro é visível a olho nu, assim como quando se vê o ar nos raios de sol que entram pela janela.
Por isso, não fiquei propriamente espantada ao ver o desenho dele da família, na parede da escola, com a cabeça do pai (só desenha as cabeças) a ocupar grande parte do espaço. Fiquei foi um bocado sentida, digamos, ao perceber que a minha cabeça era a única, assim, esquisita, um ovo torto, pronto. Além disso, os únicos registos com cor estavam na cabeça do pai (acho que tinha as orelhas azuis) os restantes estavam todos desenhados a preto e eu tinha um pormenor cinzento, o cabelo, se não me engano.
Já em casa perguntei-lhe qual era a cor favorita dele. Ele respondeu cinzento e eu fiz um daqueles sorrisos parvos.

ACTUALIZAÇÃO
O pai fotografou o desenho (claro) e afinal eu também tenho azul na barba (?).

         da esquerda para a direita: pai, mamã, Bea e Nicolau.

A sério?

28.5.13
"This is             Optical Co., Ltd., a worldwide popular eyeglasses store which has over 580,000 fans on Facebook. I found that your blog is so fantastic & awesome, so here I was wondering if there is any possibility of cooperating with you."

Às vezes a internet é uma coisa deveras assustadora.

Ainda não tenho os óculos novos

24.5.13
Eu gosto de fazer desvios nos meus percursos blogoesféricos habituais, mas depois bato de frente com a minha insignificância perante alguma da inteligência que circula em alguns círculos e fico deprimida. Se calhar gosto de ficar deprimida, não sei, ou então é uma forma de ser, como outra qualquer. Mas tenho pena que me falte o entusiasmo, porque há coisas bonitas a acontecer na minha vida e pessoas que acham que sou entrevistável.

(Eu sei que parece que o título não tem nada a ver. E não tem mesmo.)

Há sensações universais 8

24.5.13
"Não se mostraria tão alarmado se eu, em vez de falar sobre o prazer, falasse sobre a felicidade. A palavra é menos chocante e transporta-o, em pensamento, da pocilga de Epicuro para o seu jardim. Falarei, contudo, do prazer, pois vejo que é a ele que os homens aspiram, e nada me prova que aspirem à felicidade. É o prazer que se oculta por trás de todas as virtudes que praticamos."

W. Somerset Maugham, Servidão Humana, Livros do Brasil.

Culpa

23.5.13
Contar-lhes histórias inventadas; fazer ensopados de cebolinho, sal, arroz e colorau; fazer de conta que somos o corcunda de Notre Dame a persegui-los para que cheguem mais depressa a casa; cheirar-lhes a curva do pescoço quando nos dão aqueles abraços; ouvi-los rir; responder a perguntas complicadas como "quem fez as nossas mãos"; tê-los aninhados no colo; dançar com eles, apaziguar-lhes angústias e relativizar certos comportamentos, os comportamentos certos (queremos nós acreditar) é bom. É fácil. O problema é ser preciso fazer o comer, ou pior, comprar as coisas para fazer de comer; lavar roupa, secar roupa, dobrar roupa; lavar louça, guardar louça; limpar, esfregar e arrumar coisas e mais coisas e coisinhas. Mas também se fosse tudo bom e fácil não tinha piada.
Agora, já que não temos ninguém [um(a) empregado(a), um(a) avô(ó), ou um(a) tio(a)] para nos fazer uma sopinha e limpar a casa de vez em quando, e sendo essa parte dos meus dias a que mais detesto, será assim tão errado ficar de mau humor? Sim, é possível que eu esteja de mau humor todos os dias, mas eu tenho alguma culpa que seja preciso comer e vestir todos os dias?

E o prémio de melhor comentário de sempre vai para...

21.5.13
O Anónimo 21 Maio, 2013 17:39, pois claro.

"Sois todas passadas,coitados dos filhos que têm mães assim,ide trabalhar que o GASPAR agradece..........Já me esqueçia não gostas de trabalhar."

As pessoas que não crescem*

21.5.13
Um dos meus exercícios favoritos ao acordar é imaginar que nenhum de nós vai trabalhar, que posso ficar a dormir com o Nicolau e a Bea (os dorminhocos da famíla), enquanto o Jaime e o Isaac (os madrugadores) vão comprar pão e croissants à padaria. Depois saímos todos para voltar com o cabelo desgrenhado e os lábios secos e um cansaço bom. Também trazemos petinga+boroa+aflace e tomate. Não, alface e tomate ainda há no frigorífico. Depois terei de inventar uma justificação de faltas para a Beatriz. 
Ou então, podemos fazer isto tudo no fim-de-semana, penso eu num acesso de lucidez, mas aí já não tem a mesma piada. Acho que vou ali ao chat convencer o meu gajo a ser irresponsável e já volto. 
(As pessoas que não crescem, coitadas, são assim.)

*e que até são bastantes

Desafios

20.5.13
Berro menos com os putos desde que aderi ao berra-me baixo, é um facto. Até comecei a reparar que o pai também lhes berra ocasionalmente (não sei se ele berrava antes, ou se eu nunca tinha reparado), mas a verdade é que os berros não me preocupam muito. Ou seja, levantar a voz para ser ouvida no meio do chinfrim que fazem todos ao mesmo tempo parece-me natural, ainda que possam haver formas mais criativas (eu tinha um professor que começava a sussurrar, quando a turma perdia as estribeiras e aquilo funcionava). Muitas vezes começo a bater palmas, outras faço um shiu com tanta força (e com tantos perdigotos à mistura) que se ouve do outro lado da rua e às vezes, mais raramente, faço coisas parecidas com a dança da chuva. Eles calam-se, claro, e concordam em partilhar os brinquedos, brincar sem arrancar cabelos, ou deixar de atirar água para fora da banheira, mas dali a pouco está tudo igual outra vez. E isto é extremamente cansativo, já se sabe.
Mas dizia que não são os berros que me preocupam por aí além (será que é porque berro menos?), o que me preocupa é o constante ranger dos dentes, o revirar dos olhos, o praguejar baixinho, em suma, a falta de paciência. E a falta de paciência tem um remédio santo, que não se compra nas farmácias, ou se calhar compra-se, mas não tenho a receita. Ir a uma festa de amigos, beber dry martinis, dançar e cantar aos gritos, é um deles e posso garantir que resulta (ver o FCP ser tri-campeão também). 
Pais felizes, filhos felizes, certo Magda

Fusão

17.5.13
Há uns tempos li qualquer coisa sobre os projectos de vida das pessoas precisarem de um longo caminho para amadurecerem, ou encontrarem a melhor forma de se exprimir. E parece-me que começo a saber exactamente o que isso quer dizer.
Quando recomecei a costurar, ou seja, quando me mudei para Lisboa, sentia que podia fazer alguma coisa "importante" com a máquina de costura e as agulhas de tricot, mas não sabia exactamente o quê. Por isso, fui aprender a fazer quilts, a tricotar meias, a costurar coisas que nunca tinha costurado antes. Viver a pouca distância da Retrosaria foi determinante nas minhas escolhas e no meu percurso, mas foram precisos quatro anos para que as minhas experiências se cruzassem com as do Jaime para nascer aquele que esperamos que venha a tornar-se o nosso projecto de vida.
Parece que tivemos uma ideia luminosa e pusemos mão à obra, não parece? Mas não, a Oporto Lobers andava nas nossas cabeças há anos, nós é que ainda não sabíamos disso.

Magia

16.5.13
A mim nunca ocorreu escrever crónicas do autocarro, porque apesar da minha tendência para desenhar personagens à volta dos passageiros frequentes, ao ponto de às vezes me parecer que somos velhos conhecidos e quase meter conversa para perguntar a uma como está o irmão irresponsável, ou a outra se estão a correr bem os tratamentos para a infertilidade, a verdade é que as carreiras que tenho frequentado são muito pobres em acontecimentos. Quando andava no 35, sim, ocorriam umas quantas intercorrências com merecimento de destaque, mas agora no 701, tirando um motorista louco que insulta todos os automobilistas e peões nas passadeiras e que põe o rádio nas alturas, não há nada de interessante a relatar.
Mas no outro dia houve assim uma espécie de intervalo e, como toda a gente sabe, nos intervalos há publicidade e na publicidade há mocinhas giras.
Ela deveria ter uns 16, ou 17 anos. Preciso de dizer mais alguma coisa? Pois, mas eu digo na mesma, que a juventude, só por si, não é tudo. 16 anos, cabelo castanho escuro, comprido e liso, espalhado pelas costas daquela forma rebelde e incerta dos cortes de cabelo modernos. Um pele lisa (tão lisa, meu deus!) e trigueira. Uma mistura de curiosidade e ingenuidade no castanho dos olhos e toda uma graça nos gestos, no andar, no sentar do metro e setenta de um corpo de 16 anos. Ainda por cima vestida da forma mais elegante que existe: uns jeans (justos, obviamente), uma camisola larga, com elástico em baixo, e umas All Star. Pareceu-me a visão da perfeição. Que deleite!
Mas depois a gaja saca de um magnum sandwich e põe-se a mastigá-lo de boca aberta. Por um momento sorri, agradecida por a miúda não se pôr a lamber o gelado, mas depois fiquei com pena por se ter quebrado aquele momento mágico.

Perguntas que gostava mesmo de saber a resposta

15.5.13
As mulheres que afirmam que o gajo que escolheram para passar o resto da vida é mais um filho para tratar fazem-no por autocomiseração, ou orgulho? E, em qualquer um dos casos, a sério que isso faz algum sentido?

Do fim-de-semana

13.5.13
Posso adiantar que este fim-de-semana bebi vinho. Também escrevi um post muito engraçado, com um título mesmo, mesmo espirituoso, que tinha a ver com o facto de eu ter descoberto que afinal o Brecht não se chama Bertolt, mas sim Bertlot e outras coisas que já não me lembro, mas que de certeza eram fantásticas, porque eu estava a dormir e, como já referi várias vezes, é a dormir que eu tenho uma vida que é uma riqueza.
Entretanto, aconteceu mais ou menos de repente (não necessariamente este fim-de-semana) de os dois rapazes começarem a conversar um com o outro, assim do género conversas profundas, como: "zaquii, a mamã?" "A mamã está a dormir, Nicolau, chama antes pelo pai"; e de a rapariga estar da minha altura e com umas mamas enormes.

Isto podia ser a letra de uma canção da Adelaide Ferreira*

10.5.13
Este fim-de-semana vou costurar, limpar a casa, comer bolas de berlim. Vou ter sono, vou lembrar-me de não berrar quando estiverem os dois pegados, ou talvez nem me apeteça berrar, porque afinal eles são lindos, vou ter saudades da Bea, vou beber vinho com o Jaime e sorrir-lhe. Vou sorrir ponto. Vou planear menus e dietas e picar folhas frescas de acelga (seja lá o que isso for) para as rugas. Vou finalmente comprar os óculos novos e vou ao jardim jogar à bola. Vou à retrosaria comprar batting e vou trazer tecidos e lãs, de certeza. Se calhar vou pintar as unhas. Talvez veja um filme.

* mas é só uma espécie de declaração de intenções

P.S O Nicolau já está bem.

Decisões

9.5.13
Decidi, pela terceira vez este mês, que ia começar uma dieta. Correu tudo muito bem até à hora de jantar, por isso decidi que tenho de deixar de decidir fazer dietas.

Respirar

8.5.13
Todas as noites, antes de adormecer, penso nas coisas terríveis que não aconteceram aos meus filhos. Todas as noites inspiro profundamente, retenho o ar, expiro profundamente retenho a ausência de ar, volto ao início e repito a mesma coisa meia dúzia de vezes para afastar as imagens terríveis que vêm invariavelmente ter comigo. Acontecem a tanta gente, essas coisas terríveis, é óbvio que também podem acontecer comigo. É doentio, mas não consigo afastar-me desses pensamentos. Por isso, ontem, quando o Nicolau acordou a gritar com dores nas pernas, incapaz de se segurar em pé, eu pensei: pronto, chegou o dia em que vou enfrentar a pior coisa da minha vida.
Deixei de saber respirar. E não respirei mais, acho, até ouvir o "não é nada de grave".

Perguntas que eu gostava mesmo de saber a resposta

6.5.13
Eu não sou a única mãe no mundo que se está a marimbar para o dia da mãe, pois não?

Crónicas do autocarro

3.5.13
Há a crónica do peidorreiro (Flatulência), claro, ou a das badalhocas com os penates em cima dos bancos (Ulisses) e a da mulher que foi salva pelo cigarro (Tragédia), e que me ficou gravada na memória para todo o sempre, além das crónicas sobre a Clarineide. Mas há muito mais no livro que junta todas as Crónicas do autocarro, do Manuel Jorge Marmelo. Custa 5€ e como diz a Dora, no seu jeito imbatível, vale mesmo a pena.

Ver-me ao espelho

2.5.13
Neste momento era gaja para gostar de ver um filme sobre uma mãe muito angustiada, que adora as suas crias, que acorda a meio da noite para lhes dar beijos, que tem conversas profundas com elas, que lhes colhe flores das bermas da estrada a cheirar a mijo de cão, que lhes ensaboa as cabeças e penteia-as com o pente dos piolhos mas que, por outro lado, suspira e revira os olhos sempre que os tem de levar ao supermercado, ou tenta ter uma conversa à mesa, que fica esgotada nas pouquíssimas horas que passa com eles e que pragueja na cozinha. Alguma sugestão?