Árvore genealógica das pessoas imaginadas

30.5.14
foto daqui
Hoje, de madrugada, tive uma longa conversa com uma sobrinha neta da minha avó muja. Era a Ilídia e eu nunca a tinha visto na minha vida, nesta ou na dos sonhos. Estávamos sentadas, eu num muro ela no chão, num carreiro parecido com um caminho que frequentava em miúda, e que aparece algumas vezes nos meus sonhos, com um ambiente parecido ao do festival Imaginarius de Santa Maria da Feira.
Falámos sobre a minha avó e sobre a morte, mas não me lembro da conversa. Fixei, no entanto, que ela me fez lembrar um índio que conheci num sonho muito antigo e fiquei a pensar se seriam da mesma família. 
Às tantas devia começar a fazer a árvore genealógica das pessoas imaginadas.

Foco (para agradar a um dos poucos leitores masculinos deste blog)*

28.5.14
Não há, penso eu, quem não se detenha, em determinados momentos, a pensar na vida, nas escolhas que fez, nos caminhos que nos conduziram aqui e ali. Eu devo fazê-lo umas duas, ou três vezes por dia, um exagero, mas essa tendência piora dramaticamente quando procuro escola para os pequenos.
Vamos mudar de bairro e a escola deles fica fora de mão. O ensino público é a nossa primeira escolha, mas como já estão inscritos na zona de residência actual não podemos alterar. Temos de esperar pelos resultados e tentar uma transferência (o 3.º milagre?), só que tratando-se do pré-escolar há pouca esperança.
Portanto, lá fui ver alternativas. E a sensação é sempre a mesma, por muito boas que sejam as instalações, as pessoas que lá trabalham e a comida que sai da cozinha imagino os meus filhos a crescer mais felizes noutro registo. Imagino-os a plantar couves num quintal, a correr nus, a fazer montes de areia iguais aos formigueiros. A pintar e juntar letras também, claro, e a fazer passeios. 
Enfim, se calhar devia era estar preocupada com a nova secretária do Jaime, uma vez que os rapazes até vão para a escola felizes e eu de nova já tenho pouco. 

(Já agora, se alguém tiver informações de infantários na zona dos Anjos é favor dizer)

*Para quem não percebeu mudei o título, o anterior era "Enfoque"

Eu sou uma pessoa doente

26.5.14
Diz que estou anémica. "Anemia microcítica hipocrómica. Anisocitose". Não faço ideia do que significa, mas vou decorar o nome para atirar à cara de certas e determinadas pessoas que se riem muito por eu andar "sempre cansada", ou "sempre mal disposta". Ouviram meu querido e minha querida? eu tenho ANEMIA MICROCÍTICA HIPOCRÓMICA! Eu sou uma pessoa doente e tenho provas.

Ando a ver demasiada internet

22.5.14
Hoje bebi um batido de banana com sementes de chia e canela e depois fui correr. Mas, em minha defesa, devo dizer que fui sem roupa interior, porque não tinha cuecas lavadas.

Perguntas que eu gostava mesmo de saber a resposta

21.5.14
Porque será que bastou eu começar a lavar a roupa de Verão e arrumar a de Inverno, para começar a chover desta maneira?

Porque é que as pessoas que andam a fazer dieta já não comem aquelas bolachas que parecem pipocas?

No Museu

19.5.14

No Dia Internacional dos Museus fomos à Gulbenkian (seria um crime não visitarmos um museu qualquer e este tem a vantagem de a seguir podermos soltar as crias nos jardins).
A obra de cima estava pendurada mais ou menos à altura do Isaac e, sim, foi um bocado assustador vê-lo correr em direcção ao solitude e passar por aquilo rés vés Campo de Ourique, mas tudo acabou bem.
O Nicolau, talvez por estar imobilizado, concentrou-se nas exposições e revelou-se um verdadeiro expert.
No fim disseram que o que mais gostaram foi da "aranha verde" (na imagem de baixo), mas vi-os bastante entusiasmados com alguns dos vídeos de João Tabarra.
Os meus filhos podem ser broncos, que são, mas ao menos são broncos em sítios finos.

Conseguir estar bem

17.5.14
Num daqueles raros momentos de lucidez acabei por perceber que tenho de aceitar aquilo que sou (ponto). Se até a minha médica quase se riu da "questão glúten", quer dizer, que mais posso fazer? É bem verdade que ciclicamente procuro justificações para a minha supostamente inexplicável "infelicidade", e depois? Faz parte de mim, mais vale viver com isso.
Eu sou a gaja que chora a ver um episódio do "Anatomia de Grey" e que fica fascinada com as questões da linguagem, como a que o poeta Yves Bonnefoy* descreve, ou Thomas Walgrave* revela.
Sou a gaja que tem horror ao telefone e aos supermercados e que adora conversar e ver coisas bonitas.
Que se aborrece atrozmente enquanto não é surpreendida por um campo de milho, uma exposição, um beijo na nuca, um convite inesperado.
Sou a gaja que não pára: "[06-05-2014 13:55:30] Jaime Xavier: céus Calita
                                        [06-05-2014 13:55:36] Jaime Xavier: tu não páras
                                        [06-05-2014 13:56:58] Jaime Xavier: IRS, blogue, banco, psiquiatra no Porto, medicação da médica de família, Lifecooler, costura e agora psicóloga, depois de compras de bicicleta no Pingo Doce. Entre vinho e aborrecimento da vida doméstica e oposição ao amante. Um furacão tu". E sou a gaja que dorme, dorme, dorme,dorme.
A que tem manias de grandeza embrulhadas no papel de celofane que é a minha baixa auto-estima.
A que bebe mais do que deveria.
Sou a gaja que nem sempre coabita harmoniosamente com a maternidade.
Sou a que nunca está bem e só quer estar bem.
É, mais vale viver com isso e conseguir estar bem mais vezes.


* O poeta francês descreveu a língua inglesa como um "espelho" e a francesa como uma "esfera".
**Numa entrevista o director artístico explicou que fez parte de uma equipa que arranjou um método para ensinar geometria a uma comunidade de índios Navajo do Arizona , Novo México. Ninguém percebia porque é que os alunos não conseguiam tirar boas notas a essa disciplina e a conclusão a que chegaram é que era a uma questão de tradução. A língua dos Navajos só tem verbos, ou seja tudo é descrito em termos de processo. Uma montanha não é um objecto é um processo em construção, ou desconstrução. Walgrave deu ainda o exemplo de que de um copo vermelho diz-se que é redning. 

Perguntas que eu gostava mesmo de saber a resposta

16.5.14
Mas porque raio é que o "Caderno Vermelho", do Paul Auster, andou este tempo todo de casa em casa e estante em estante, dentro do "Experiências com a Verdade", sem que eu lhe pusesse os olhinhos em cima? É que ainda por cima eu nutro um certo fascínio pelo escritor.

["Pensando na amizade e, em particular, em como algumas amizades se mantêm e outras não, lembro-me do facto de só ter tido quatro pneus furados desde que conduzo, e que, em cada uma dessa ocasiões estava no carro com a mesma pessoa (em três países diferentes, num período de oito ou nove anos)."]

Mãe deles

14.5.14
Hoje, vi-me confrontada com uma situação que me costuma aterrorizar quando o Jaime está fora do país: Fui para o hospital com a mais velha, que estropiou o pescoço numas cambalhotas na aula de Educação Física, sem saber quando estaria livre para ir apanhar os mais novos à escola.
O Jaime, apesar de não estar em Lisboa, estava a duas horas de distância, o que permitiu que adiasse reuniões e essas coisas de pessoas com empregos e responsabilidades para se pôr a caminho a 200 Km à hora (isto é uma metáfora para dizer que veio muito depressa, porque aquela "regeneração do condutor" que fez há uns tempos foi muito útil cof, cof).
Ou seja, enquanto eu estava no hospital com uma, ele conseguiu ir buscar os mais novos ao infantário mas, como a vida tem destas coisas, acabamos por nos encontrar todos na urgência de ortopedia do Hospital Dona Estefânia, porque o Nicolau tinha o pé partido.
Isso, no mesmo dia fomos para a urgência com dois filhos, ou melhor com três, sendo que o do meio era o único saudável (tão saudável que fez maratonas em vários corredores).
E ali, no hospital, pareceu-me que tenho muitos filhos. Demasiados filhos para a minha capacidade para processar determinadas coisas, como o facto do SNS estar muito diferente daquele que usufruí há cinco anos para se aproximar daquele que frequentei quando era criança/jovem adulta.
Agora que dormem, engessados e drogados dois deles, preocupa-me não ter apanhado a roupa do estendal e estendido a que está na máquina há dois dias. Preocupa-me não ser capaz de me multiplicar em três.
No entanto, estranhamente, sinto (talvez porque eles me fazerem sentir) que sou boa nisto de ser mãe deles.

Glúten

12.5.14
Estávamos à mesa quando declarei que ia iniciar uma dieta sem glúten. Olharam para mim atónitos (o Jaime e Bea) e eu esclareci que me parecia que era intolerante a esta substância. Riram-se, os dois, a bandeiras despregadas. Custa-me um bocado não ser levada a sério, mas eu própria não me levo muito a sério. Ri-me também, claro e passado umas horas enchi o bandulho de pão.
A sério, tenho mesmo de começar uma coisa e levá-la até ao fim. Faço isso muito bem com garrafas de vinho, também há-de ser possível com outras coisas.
Se ao menos me tivessem ensinado a trabalhar "para o prazer, para o dia e para a memória", como diz FNV, não andava sempre nisto.

Arrumar

8.5.14
Não se pode esperar que uma pessoa seja bem fina da cabeça quando tem uma mesa de trabalho assim. Ao longo do dia salto de uma coisa para outra e no fim parece que não fiz nada.
Preciso de arrumar a vida.

1.º milagre

7.5.14

Arranquei um bocado de uma árvore muito bonita, que vi em Montemor-o-Novo, e trouxe-a para casa na esperança de conseguir que pegasse. Pegou. É o primeiro de três milagres que espero obter.

Diálogo no Jardim

5.5.14
Desconhecida - "Desculpe, aqueles meninos são seus?"
Eu - "Sim"
Desconhecida - "E a senhora deixa-os brincar descalços onde os cães fazem xixi e cocó?"
Eu (com um sorriso nada forçado) - "Sim"
Desconhecida (visivelmente transtornada e encolhendo os ombros) - "Pronto, a senhora é que sabe."

A desconhecida afasta-se e eu fico a pensar que ele há cada uma! Ainda por cima deve ter ido para casa escrever no blog que há mães que não lembram ao diabo, que deixam os filhos brincar em sítios onde passam cães.
Depois, ocorreu-me que lhe devia ter perguntado onde é que achava que eu deveria deixar os meus filhos brincar descalços, sem ser em casa, porque provavelmente ela até terá alguma razão, mas deixei-a ir à vidinha limpinha dela e fiquei na minha pouco higiénica existência.

Fotofobia no quiosque de S. Roque*

3.5.14
Juro que até ter começado a escrever este texto (sim, é habitual começar a escrever sem pensar muito e só depois ir à procura das ideias que quero desenvolver e que nunca desenvolvo, porque tenho o dom, ou defeito de economizar nas palavras) não fazia ideia da quantidade de quiosques que fazem parte da minha vida.
Há o quiosque onde tomo café aos domingos de manhã, na Estrela; o quiosque dos hambúrgueres e da sangria, no jardim da Parada e o quiosque com os cachecóis do FCP, onde o Jaime comprava o jornal "O Jogo", quase sem sair do carro, na Buenos Aires.
Havia também o quiosque no Largo da Luz, onde comprava o "Público" à sexta-feira e ouvia a história das patas gangrenadas das pombas.
Agora que penso nisso é bem capaz de não haver um único sítio em Lisboa sem, pelo menos, um quiosque.
Deve ser essa a razão para a maioria deles me passarem despercebidos, como foi o caso do quiosque S. Roque até ao dia em que estive no Largo Trindade Coelho com a minha avó (algumas pessoas estarão lembradas da estadia da minha avó aqui em casa).
Ora, deu-se, então, o caso de nos termos sentado no tal largo, depois de sair do concerto de música clássica que decorria na igreja de S. Roque, porque ela "tinha de ir mijar" (sic).
Apesar do frio, estava sol, que reflectido no calcário todo, me obrigava a semicerrar os olhos e a entrar naquele estado de semi-inconsciência, muito bem descrito na passagem de um livro (de Kafka?), em que um homem mata uma pessoa na praia nesse mesmo estado.
Fiquei a olhar para o quiosque, a pensar se já estaria ali antes de ter entrado na igreja, e que era obviamente um pensamento absurdo, e que só podia ser provocado pelo excesso de estímulos à minha volta: a luz, a minha avó surda que não se calava, as perguntas de uma pessoa sobre a Santa Casa da Misericórdia, os dois rapazes com sono, ou com fome, já nem sei...tanto ruído!
Fiquei a olhar para o quiosque, dizia, e pareceu-me um sítio perfeito, assim uma espécie de árvore, com um tronco oco, onde nos podemos esconder.
Voltei lá depois, sozinha, com vontade de perceber melhor aquele quiosque centenário e senti-me tentada a beber um brandy. Não bebi, dessa vez.

*É a semana do quiosque na Lifecooler e convidaram-me para falar sobre o assunto. E saiu assim