Do regresso

22.8.16

Antes de sair de Timor, para passar férias em Portugal, eu espantava algumas pessoas ao dizer que não estava assim tão ansiosa por visitar ao nosso querido país. Aliás, custava-me perceber aqueles "está quase!" trocados entre conterrâneos e acompanhados de sorrisos cúmplices, como se só eles soubessem do que estavam a falar.
Agora sei. Agora sei que vai ter de passar mais um ano, ou dois, até voltar a sentir frio; até voltar a juntar toda a família à volta da mesa; até estar de novo ao vivo com as pessoas de quem gosto tanto; até sentir a angustia perante a prateleira dos iogurtes e dos shampôs, porque uma pessoa já não sabe o que é ter tanta oferta da mesma coisa; até sentir outra vez o sabor dos mexilhões, da pescada e do sarrabulho; até sentir o cheiro daquele mar; até adormecer e acordar rodeada de familiaridade...Não é que não soubesse antes de ir, mas agora sei de outra forma.
Agora sei, também, o que quer dizer o encolher de ombros e o sorriso resignado dos que regressam de férias. Quer dizer: o que eu queria era ter lá ficado.

Poderão dizer-me que isso é exactamente o que sente toda a gente quando termina as férias, e dirão muito bem, mas uma coisa é sair de casa para ir de férias, outra coisa é ir de férias para casa.
Ir de férias para casa é todo um novo conceito para mim. Ele é a Decathlon que passa a ser a loja mais importante, ele é marcar quatro consultas médicas de diferentes especialidades na mesma semana, ele é listas de coisas que precisamos de trazer (e depois apercebo-nos que não trouxemos os casquilhos, nem as tomadas eléctricas), ele é carrinhos cheio de tralha só porque é uma tralha mesmo bonita e aqui não há coisas daquelas bonitas à venda, ele é assinar papeis para resolver burocracias. Enfim todo um mundo novo de veraneio. Uma espécie de interlúdio da vida de todos os dias para viver a vida que tínhamos antes.

E no fim custa regressar. Há um pedaço arrancado de mim que ficou lá (nota: ouvir a Ópera do Malandro) e a insularidade pode ser uma cena fodida, além de que as rotinas, mesmo numa ilha tropical cheia de encantos, não deixam de ser rotinas.
Só que depois chegamos à nossa casa tropical e temos o nosso cão à espera, num contentamento louco. Vemos o pôr-do-sol, corremos os olhos pelo verde Timor, damos um mergulho no mar, bebemos água de coco e acordamos com o som dos pássaros nos ouvidos - eles estão do outro lado da janela do quarto, mas parece que piam como se nos contassem segredos.
Enfim, depois, tudo está como tem de estar.
É um pouco como diz na crónica da Alexandra Lucas Coelho, trocando o nome dos países: Morar em Timor é bom mesmo sendo uma merda.

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