Antes de sair de Timor, para passar férias em Portugal, eu espantava algumas pessoas ao dizer que não estava assim tão ansiosa por visitar ao nosso querido país. Aliás, custava-me perceber aqueles "está quase!" trocados entre conterrâneos e acompanhados de sorrisos cúmplices, como se só eles soubessem do que estavam a falar.
Agora sei. Agora sei que vai ter de passar mais um ano, ou dois, até voltar a sentir frio; até voltar a juntar toda a família à volta da mesa; até estar de novo ao vivo com as pessoas de quem gosto tanto; até sentir a angustia perante a prateleira dos iogurtes e dos shampôs, porque uma pessoa já não sabe o que é ter tanta oferta da mesma coisa; até sentir outra vez o sabor dos mexilhões, da pescada e do sarrabulho; até sentir o cheiro daquele mar; até adormecer e acordar rodeada de familiaridade...Não é que não soubesse antes de ir, mas agora sei de outra forma.
Agora sei, também, o que quer dizer o encolher de ombros e o sorriso resignado dos que regressam de férias. Quer dizer: o que eu queria era ter lá ficado.
Poderão dizer-me que isso é exactamente o que sente toda a gente quando termina as férias, e dirão muito bem, mas uma coisa é sair de casa para ir de férias, outra coisa é ir de férias para casa.
Ir de férias para casa é todo um novo conceito para mim. Ele é a Decathlon que passa a ser a loja mais importante, ele é marcar quatro consultas médicas de diferentes especialidades na mesma semana, ele é listas de coisas que precisamos de trazer (e depois apercebo-nos que não trouxemos os casquilhos, nem as tomadas eléctricas), ele é carrinhos cheio de tralha só porque é uma tralha mesmo bonita e aqui não há coisas daquelas bonitas à venda, ele é assinar papeis para resolver burocracias. Enfim todo um mundo novo de veraneio. Uma espécie de interlúdio da vida de todos os dias para viver a vida que tínhamos antes.
E no fim custa regressar. Há um pedaço arrancado de mim que ficou lá (nota: ouvir a Ópera do Malandro) e a insularidade pode ser uma cena fodida, além de que as rotinas, mesmo numa ilha tropical cheia de encantos, não deixam de ser rotinas.
Só que depois chegamos à nossa casa tropical e temos o nosso cão à espera, num contentamento louco. Vemos o pôr-do-sol, corremos os olhos pelo verde Timor, damos um mergulho no mar, bebemos água de coco e acordamos com o som dos pássaros nos ouvidos - eles estão do outro lado da janela do quarto, mas parece que piam como se nos contassem segredos.
Enfim, depois, tudo está como tem de estar.
É um pouco como diz na crónica da Alexandra Lucas Coelho, trocando o nome dos países: Morar em Timor é bom mesmo sendo uma merda.
É a filhota ficou em Portugal?
ResponderEliminarSim, ficou.
EliminarEssa situação para mim seria impensável, impossível de gerir...
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