Só vemos o que queremos ver

6.11.18

Estava no café da Ponte, com vista para o rio Gerês, e na mesa à minha frente estava um casal a tomar o pequeno-almoço. Deviam ter uns 60 anos e não falaram um com o outro enquanto lá estive. Dei mais atenção à mulher, porque tudo nela dizia que estava no sítio certo à hora certa, a comer uma torrada com meia de leite. Até quando pegou no telemóvel para fazer um scroll rápido foi exacta. Tudo batia certo, talvez por isso me tenha parecido bonita.
No dia seguinte, quase no fim da minha caminhada, uma mulher começa a dirigir-se na minha direcção e eu vou-me afastando para lhe dar espaço e ela a desviar-se cada vez mais até ficar de frente para mim:
- Desculpe - Olhei para ela e reparei que tinha um sorriso bonito, apesar do diastema, ou talvez por isso mesmo.
- Sabe dizer-me se há algum cabeleireiro aberto, hoje? - Obviamente olhei para o cabelo curto, maravilhosamente penteado apesar do vento e sem vestígios de raízes brancas.
- Hmmm, não faço ideia, mas na Póvoa a uma segunda-feira acho muito difícil - respondi sem conseguir disfarçar a surpresa, acho eu. Ela agradeceu e continuou a andar.
Segui caminho a pensar que esta mulher tinha alguma coisa em comum com a do dia anterior. Apesar de serem completamente diferentes fisicamente tinham, lá está, a mesma exactidão.
Provavelmente a do café era só uma senhora segura de si, que obrigou o marido a sair para tomar o pequeno-almoço, e a segunda uma cabeleireira a tentar perceber se valia a pena montar um negócio na Póvoa para abrir só às segunda-feiras, mas eu vi outra coisa qualquer. Fazemos sempre isso, só vemos o que queremos ver.

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