Cicatrizes

9.6.15
A nossa impressão de que o Nicolau dificilmente atravessaria a infância sem cicatrizes confirmou-se. Ontem, caiu do beliche para cima do triciclo e esfarelou a bochecha. Por momentos pensei que ia desmaiar (eu, não ele) mas depois lá os vesti rapidamente, chamei um taxi e fui para o Estefânia.
A Bea não estava em casa e o Isaac, sempre tão complicado em algumas situações, portou-se como um senhor. O Nicolau esteve sempre como se nada fosse, pelo menos até começarem a coser-lhe a cara.
Eu revi várias vezes, na minha cabeça, o que deveria ter feito para evitar o acidente, bastava ter espreitado uns segundos antes para ver ao que estavam a brincar e nada daquilo teria acontecido.
Depois, talvez para me martirizar, voltei para casa a pé com ele ao colo. O Isaac, sempre tão complicado em algumas situações, portou-se como um senhor, a caminhar ao meu lado a avisar-me quando os semáforos ficavam verdes.

Tínhamos almoçado, os três, no Martim Moniz, eles tinham-se divertido imenso nas fontes, e depois um acidente estúpido, como todos os acidentes.
Revi outros acidentes que não aconteceram, como aquele em que o Isaac, quando tinha pouco mais de três anos, descobre nos armários da cozinha um queimador de leite creme que nunca usei na minha vida (e que já não tenho) e decide ligá-lo numa tomada. E eu estava ali, ao lado dele, ocupada com qualquer coisa, convencida que ele estava a brincar com tupperwares, porque era a única coisa que estava ao alcance deles, nunca me lembrando daquela caixa com um queimador de leite creme dentro.
Ou o do armário que devia estar preso à parede e cai em cima do Nicolau sem lhe tocar, porque bate primeiro na mesa.

Hoje não foram à escola, claro, porque poderia muito bem acontecer de o mais novo sair de lá com os pontos rebentados e, por isso, passei o dia a obrigá-los a estar sentados, a não jogar à bola, a não correr, assim tipo histérica mesmo. Obviamente, não é suposto viver-se desta forma, ainda que seja verdadeiramente stressante uma pessoa desviar os olhos para pagar a conta do supermercado e quando olha para eles já estão de cabeça para baixo naquelas grades das caixas, sendo que um deles tem pontos na cara que podem infectar, rebentar e sei lá mais o quê.
A minha mãe acha que se levassem no focinho não eram assim. E muitas outras pessoas acham outras coisas. Eu gosto que eles sejam como são, desde que tenham noção que é preciso respeitar os outros, a começar pelos pais, que é onde tudo começa. E acho que faz parte eles irem experimentando até onde podem ir.
Escusavam era de querer ir sempre mais além. Mas quem sou eu para os censurar?

Sem comentários:

Enviar um comentário