Ao ler esta crónica percebi finalmente esse sentimento que dizem ser exclusivamente português, porque a palavra só existe em português: a saudade. Dizem, as pessoas que estudam estas coisas, que a língua de um povo determina a sua forma de ser (e disse-me o Jaime que os timorenses são como o tetum, uma língua em que hanoin é a palavra usada para traduzir "saudade" e que também quer dizer "pensar"), mas não é disso que quero falar, até porque não me lembro de quase nada do que disse o Wittgenstein e o Roland Barthes, os únicos que tenho uma vaga ideia de ter lido sobre este assunto (e aqui poderíamos abrir um outro parêntese para falar sobre a minha memória, mas agora não interessa nada).
Voltando à saudade, foi exactamente aquela parte do texto em que o jornalista diz que só vê os pais uma vez por ano e por isso tem saudades dos almoços de domingo, ou que sente saudades de ver a afilhada tornar-se mulher, porque a deixou criança antes de sair do país, que finalmente compreendi a minha não saudade dos filhos bebés. É certo que eu ainda tenho um filho bebé, mas também tenho uma filha de quase 12 anos e outro que vai fazer quatro. E não, não sinto saudades dos meus filhos pequenos. Percebo agora porquê.
Eu vivi tudo o que havia para viver enquanto eles foram pequenos. Vivi tudo muito intensamente. Nem sempre aproveitei tudo que havia para aproveitar e disso, sim, tenho algumas saudades, mas de resto está bem assim: Eles a crescer, às vezes muito depressa, às vezes muito devagar.
A saudade é, portanto, um sentir falta do que não se viveu. Por isso temos muitas vezes saudades do futuro. Quem é que disse isto? Terá sido o MEC? Bom, na altura não fez tanto sentido como faz agora.
Saudade -Qué será?... yo no sé... lo he buscado
ResponderEliminaren unos diccionarios empolvados y antiguos
y en otros libros que no me han dado el significado
de esta dulce palabra de perfiles ambiguos.
Dicen que azules son las montañas como ella,
que en ella se oscurecen los amores lejanos,
y un noble y buen amigo mío (y de las estrellas)
la nombra en un temblor de trenzas y de manos.
Y hoy en Eca de Queiroz sin mirar la adivino,
su secreto se evade, su dulzura me obsede
como una mariposa de cuerpo extraño y fino
siempre lejos -tan lejos!- de mis tranquilas redes.
Saudade... Oiga, vecino, sabe el significado
de esta palabra blanca que como un pez se evade?
No... Y me tiembla en la boca su temblor delicado.
Saudade...
(Pablo Neruda)
Como não estou em Portugal neste momento a saudade é sentir falta do que não estou a viver...Hoje queria comer broa, ir à feira comprar um galo de Barcelos que o meu partiu, ir ver os meus sobrinhos, ir ao café lanchar um galão e uma torrada...
ResponderEliminarObrigada pela poesia. É sempre tão bom voltar ao Neruda!
EliminarP.S Queres que mande uma torrada pelo expresso (galão é capaz de ser mais difícil)?
Eliminar...mas a torrada tinha que ser comida sentada na praça da Oliveira em Guimarães, a ouvir os sinos e a erguer o braço para cumprimentar a gente conhecida que passa...
EliminarAcho que sim, que foi o MEC que disse isso. Na altura que li fez-me todo o sentido, sentia saudades do futuro. Agora sinto do passado.
ResponderEliminarCaraças, sinto saudades do passado, do futuro e até do presente e estou a medir cada um destes tempos.
ResponderEliminarTenho saudades de tudo. Do que vivi bem, do que vivi mal, do que não vivi, do que viveria, do que viverei. As saudades são todos os alfinetes que tenho espetados, pelas várias vidas que sinto que tinha todo o direito de viver mas só tenho uma, onde é que já se viu?
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