Quando era miúda adorava ir a passeios, como todos os miúdos, suponho, mas a certa altura da viagem acabava por ser, invariavelmente, invadida por uma tristeza imensa, uma melancolia. Era coisa para durar poucos minutos, naquele tempo, mas mesmo assim não deixava de me perturbar. Com o passar dos anos fui associando essas vagas de tristeza à paisagem das Estradas Nacionais e, por vezes, ao próprio destino da viagem - não estou a ver, por exemplo, como é que uma ida a São Bento da Porta Aberta, pode animar uma adolescente, mas acabei por perceber que há sítios que, por razões desconhecidas, se deixam impregnar pelos sentimentos de milhões de pessoas que por ali passaram.
O escritor Patrick Modiano é exímio a descrever essa sensação, no livro "Dora Bruder". Só para dar um exemplo: "No entanto, apoderava-se de mim um mal-estar que vinha da luminosidade particular do filme, da própria textura da película (...) Compreendi subitamente que este filme estava impregnado pelos olhares dos espectadores do tempo da Ocupação (...) Na obscuridade de uma sala de cinema, estavam todos apertados uns contra os outros, seguindo o fluxo das imagens no ecrã, e já nada podia acontecer. E, por uma espécie de processo químico, todos estes olhares haviam modificado a própria substância da película, a luz, a voz dos actores".
Patrcick Modiano, Dora Bruder, tradução G. Cascais Franco, edições Asa, 2000
A culpa não é tua Calita, de facto havia destinos que não lembravam ao diabo... E como pessoas sensíveis absorvemos as aspirações imaginadas dos outros. Só que nessa altura abríamos a mochila comíamos um panado e umas batatas fritas da merenda preparada pelo carinho (imaginado) da mãe e passava.
ResponderEliminarNunca tinha pensado nisto assim...mas pode muito bem ser...
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