Tal como dizia num comentário, eu costumo pensar sobre o que me apetece escrever e depois vejo como encaixar o tema. Obviamente, desta vez vi-me sem saber muito bem o que dizer. Já tinha decidido escrever sobre a senhora idosa que vive na rua mais íngreme do morro, onde várias pessoas escorregam por dia, sobretudo com o piso molhado, enquanto ela caminha naturalmente, em chinelos de quarto, com as dificuldades normais da idade e a dar os bons dias a quem lhe é familiar. Um dia destes, a caminho do emprego, disse-lhe que com este frio está-se bem é na cama e ela, pois mas a gente tem de fazer as tarefas.
Entretanto, hoje, a descer a Rua das Flores uma senhora sentada numa cadeira de rodas pediu-me para lhe pôr um cobertor pelas costas e depois de agradecer desejou-me bom dia de trabalho. Não faço ideia como sabia que eu ia trabalhar numa rua cheia de turistas.
Duas idosas que se cruzam comigo, ou com quem eu me cruzo a caminho do trabalho tem de dar um post, pensei eu. Só que olhei para o telemóvel e verifiquei que ele assumiu que eu estava em Sampyeog-dong, que fica na Coreia do Sul. É verdade que todos os dias falo com sul coreanos, mas o telemóvel não ia situar-me num bairro da província de Gyeonggi, por causa disso, pois não?
Também me ocorreu que devia escrever sobre esta nova realidade que é ver grande parte das pessoas que me rodeiam, sobretudo da minha geração, a sofrer de alguma doença mental. Ele é depressões, distúrbios de personalidade, stress pós traumático, sei lá que mais. O Coração, lavado ou por lavar, está a perder importância. Esta tudo na mente, agora. E nos intestinos.
Depois fui interrompida pelo meu filho que estava a ouvir Valter Lobo e começamos os dois a cantar, no metro, "Só de te abraçar sinto que a música altera-me em tudo mais/A música altera o meu corpo, altera o mundo, altera-se/ Ai meu amor".
Entretanto, escrevi sobre carimbos, porque me tinha enganado no tema e achava que este estava pronto até me cruzar com um post da Cláudia Lucas Chéu que diz, a certa altura: "Nada me comove mais do que um coração lavado". Fiquei de boca aberta, até porque nem sigo a escritora nem nada, mas agora sinto-me na obrigação de ler um livro dela, ou ver a peça que está a dirigir.
Os outros corações lavados: