Não tenho nada, mas tenho, tenho tudo*

31.7.12
No segundo dia de praia em Lisboa, que é o mesmo que dizer em Almada, porque Lisboa não tem praia, penso que ser rica podia ser uma coisa boa.

(vou só abrir um parênteses para explicar que nunca quis ser rica. É um facto que sempre gostei de comer fora. Sempre odiei tratar da casa. E ter horários de trabalho. Sempre quis viajar. Mas, juro, nunca quis ser rica e isto pode parecer um paradoxo mas, acreditem em mim, não é. Além disso, se há coisa que eu tenho orgulho em admitir é a de saber, e viver com isso,  que um dia estamos confortáveis no nosso sofá e no dia seguinte não temos onde nos sentar)

Isto porque, de repente, a ideia de ter amas a espalhar protector nos meninos, preparar o lanche e evitar que comam morangos e uvas com areia me pareceu absolutamente fantástica. É claro que, como boa remediada que sou, só depois me lembrei que uma pessoa rica não se mete no carro para fazer uma hora e meia de praia na Costa da Caparica, porque, ou tem casa na praia, ou vai para um hotel plantado na mesma. Mas a questão é: as gargalhadas deles seriam maiores?

*e tenho pimbalhice que chegue a circular no sangue.

Em andamento

30.7.12
Mais de uma semana depois a tentar pensar na vida, sim, porque alguém que pensa verdadeiramente não come sarrabulho acompanhado de verde tinto como se não houvesse amanhã, nem bebe litros de vinho como se estivesse nas bodas de Caná a beber antes do milagre, era de esperar que viesse para aqui com grandes conclusões, mas não, nem coisa que se pareça.
Mesmo assim, já sabem como eu sou, não resisto a partilhar certas coisas:

1. Quando eles estão calados, ou a conversar sossegadamente uns com os outros, é dentro do carro que me sinto mais próxima da felicidade. Portanto, a minha vida deveria decorrer em andamento (com alguém a conduzir o veículo, não a mim, obviamente).

2. Uma vez que o tabaco está arredado dos meus hábitos diários, há mais de quatro anos, podia ser uma boa altura para assumir uma vida saudável e deixar-me de funambulismos entre o degredo do álcool e gorduras saturadas e caminhadas, saladas e chás. Mas, claramente, a idade não me traz bom senso, ao contrário do que seria suposto.

3. Três anos seguidos em casa é o meu limite.* Por muito que me custe aceitá-lo, por muito que não saiba explicar este sentimento de não os conseguir largar e ao mesmo tempo precisar muito, muito de os largar, essa é a verdade: atingi o meu limite (mas deixar o Nicolau na creche daqui a um mês está fora de questão. Ele está inscrito, mas é um bebé, meu deus!)

* acho importante salientar, apenas para me sentir melhor comigo própria, que desde que o Isaac nasceu recorremos ao serviço de uma babysitter quatro vezes: duas para eu poder assistir a um curso; outra para jantarmos os dois no meu aniversário (três semanas antes do Nicolau nascer) e outra para o parto do Nicolau. Ou melhor, duas para o parto do Nicolau, sendo que a primeira foi falso alarme. Portanto, foram cinco as vezes em que eles não estiveram sem um de nós, em quase três anos. 

Ele há coisas que nos deixam sem palavras

23.7.12
Eu estava aqui a pensar na vida quando a minha filha me veio dizer, muito entusiasmada, que eu tinha tido uma menção honrosa no prémio Mãe Blogger e eu juro que, depois de confirmar tal facto, não consegui controlar uma certa emoção, a puxar à lagrimita e tudo. Assim sendo, e sem entrarmos em pormenores (como o facto de ter sido a Beatriz a alertar-me sobre o assunto), não sei o que dizer, por isso fico caladinha, durante mais uns dias, pode ser? 
Obrigada do fundo deste pobre coração.


P.S Gostaria ainda de dedicar esta menção à minha família, sem a qual não haveria blog (e, pronto, o momento Óscar já ninguém me tira)

Vou ali pensar na vida e volto dentro de momentos

20.7.12

Walt Bishop - Quem me dera que o telhado voasse e eu fosse pelo ar com ele.
Laura Bishop - Oh, pára de ter pena de ti próprio.
Walt Bishop - (silêncio) Porquê?
Laura Bishop - Porque nós somos tudo o que eles têm.
Walt Bishop - (silêncio) Não é suficiente.

Pois posso (não podemos todos?)

18.7.12
E depois pensei: vou mas é fazer um vestido e fui. Agora é só desfazê-lo e voltar a fazer com as medidas certas, que é o mesmo que dizer ao menos estou aqui. Mais farta ou menos farta, estou aqui e posso fazer o que me der na real gana.

Farta

17.7.12
Estou farta do implante anticoncepcional. Estou farta do calor. Estou farta de adormecer o Nicolau ao colo. Estou farta de querer acreditar que há hobbies que se podem transformar em profissões. Estou farta de mandar currículos e cartas de motivação, sem obter respostas. Estou farta de fazer sopa. Estou farta de não saber o que quero. Estou farta de pão com manteiga. Estou farta do tapete do quarto de banho. Estou farta das formigas que insistem em partilhar a casa connosco. Estou farta das minhas sobrancelhas (o cabelo já consigo prender). Estou farta de estar sempre com fome. Estou farta de me sentir presa em casa. Estou farta de matar plantas. Estou farta do computador. Estou farta da comida dos gatos espalhada no chão. Estou farta do chão...
Ou, resumidamente, estou como ele.

Adenda 1 (depois de pôr o estrugido ao lume para o arroz de tamboril): E o que é isso interessa?
Adenda 2: O arroz estava muito bom.

Vemos coisas diferentes em alturas diferentes

16.7.12
Pronto, ok, agora que as nódoas de comida na roupa são os principais vestígios de um fim-de-semana gastronómico na melhor cidade do mundo; que consigo estar na mesma cidade que os meus amigos sem lhes pôr a vista em cima* e que fico mais entusiasmada perante a perspectiva de dormir do que sair, estou pronta para admitir que ter filhos pode mudar-nos um bocadinho a vida.

*é mentira, estive com a Dora, mas referi-lo no texto retirava-lhe um certo dramatismo que é uma coisa que eu aprecio.

Chacuti

13.7.12
Muito antes de viver em Lisboa tinha um restaurante preferido, o Tentações de Goa, ali para os lados do Martim Moniz. O que eu gostava, e gosto, do que lá se come! Tanto, que na única vez que precisei de levar uma anestesia geral pediram-me para pensar em coisas boas antes de adormecer e eu pensei na Bea e no Jaime (os rapazes não existiam ainda), dali a nada já estava alguém a abanar-me e a perguntar "e então, pensou em coisas boas?" e eu respondi automaticamente, sem pensar e sem saber onde estava, que sim, que tinha pensado no goês.
Mas depois veio a crise e vieram os rapazes e passamos de dois salários a um (não por esta ordem) e, portanto, as idas a restaurantes foram diminuindo até praticamente desaparecerem.
Por isso, ter aberto um goês, em Campo de Ourique, com take away foi a melhor coisa que me podia ter acontecido.

O mundo sensível*

12.7.12
Há novidades na "loja". Se calhar devia abrir uma loja sem aspas. E aprender a tirar fotografias. As mantas e almofadas fora do sítio até não é mal pensado, mas as ideias precisam sempre de uma base técnica para se concretizarem. Um chatice. Só me lembro de uma coisa, duas, vá, que sabe melhor a concretizar do que idealizar: cozinhar. A outra é óbvia. E daí...

*ou de como ando a precisar de voltar a Platão, e não, não leio filosofia, nem nunca mais li nada sobre, ou de Platão (A Caverna, do Saramago, não conta) desde os tempos do liceu, mas fica sempre muito bem a uma doméstica parecer intelectual.

Conversas mudas

12.7.12
Já falei muitas vezes dos acordares e de como tudo parece pior de manhã, mas é claro que ao fim do dia, desgastada e cansada como estou, parece tudo ainda mais horrível. Logo, os meus dias, ou grande parte deles, resumem-se a uns quantos frames dantescos.
A grande diferença é que ao fim do dia tenho uma enorme necessidade de verbalizar o que sinto, para mal dos pecados de toda a gente, enquanto  que de manhã sou incapaz de falar, o que não quer dizer que não olhe para o Jaime com a cara de "sim, já sei que te levantaste às seis da manhã, para entreter os rapazes até à hora em que tens mesmo de ir tomar banho, mas daqui a nada vais trabalhar, tomar café em frente à praia, conversar com pessoas, fazer uma pausa para almoço, programar a tua viagem a Timor e eu, eu VOU FICAR EM CASA". Ele olha para mim com a cara de "sabes que eu dava tudo para estar no teu lugar" e eu encolho os ombros, porque ambos sabemos que ele era gajo para fazer o que eu faço sem problemas e, muito provavelmente, com mais prazer, enquanto eu dificilmente faria o que ele faz, não pela falta de competências técnicas, que essas adquirem-se e eu tenho fama de aprender depressa, mas porque já teria mandado, há muito tempo, umas quantas pessoas lá do emprego pró caralho. Por isso, é como se costuma dizer, cada qual tem aquilo que merece.

Pele

11.7.12
Ainda no encalço das pisadas de Dom Rigoberto, hoje foi dia de hidratar a pele e, como não poderia deixar de ser, esbarrei com duas belas ilações: 1) não precisei de espalhar o creme, porque ele desaparecia automaticamente, tal a sequiosidade dos meus poros; 2) Há mesmo quem faça isto todos os dias?!?!?

Veranear

10.7.12
Pela primeira vez em quatro anos posso ir à praia sem estar grávida, ou a amamentar, e isso até poderia ser motivo de regozijo se não se tivesse dado uma transformação qualquer no meu córtex cerebral. Não sei como é que de um momento para o outro, com a tal interrupção de três anos, eu passei de andar com a mamas ao léu na praia para o não conseguir sequer despir-me. É que eu olho à minha volta e parece-me grotesco as pessoas andarem a mostrar o rabo umas às outras. Seria muito descabido voltarmos a andar vestidos na praia?

(a foto é deste maravilhoso filme)

Muito obrigada

9.7.12
Ficar na 26.ª posição, para o Prémio Mãe Blogger, deixa-me um bocado embasbacada. Muito obrigada a todos os que se deram ao trabalho de fazer cliques aqui pelo pasquim.

Viagem no tempo

9.7.12
São eles aos 10 meses e vê-los assim - cada qual no seu espaço e tempo, mas todos num mesmo espaço e tempo que ocuparam na minha vida, ajuda a relativizar muita coisa.

(Da esquerda para a direita: Beatriz, Isaac e Nicolau)

Vai-se a ver e toda eu sou optimismo 1

6.7.12
Não sei se mais alguém reparou, mas metade do ano já foi, pelo que me pus a pensar (tenham, portanto, muito medo!) nos hotspots, digamos assim, dos seis meses que passaram e, surpresa das surpresas, houve mais coisas boas do que más, sendo que só duas destas foram fruto do acaso, ou do que se quiser chamar, enquanto que as outras resultaram da minha espectacular falta de noção. Mas vamos, então, à listinha:

Coisas boas do primeiro semestre de 2012
- A ida do Isaac para a creche e a facilidade com que se integrou;
- A viagem a Londres;
- O início da minha fulgurante carreira de cronista no p3;
- O 11.º primeiro aniversário da Beatriz e o primeiro do Nicolau;
- Estas duas fantásticas experiências culturais;
- O final do ano lectivo.

Coisas más
- A Beatriz ter sido assaltada;
- A morte dos pais de duas amigas e a doença da mãe de outra;
- As minhas tristes figuras no "So you think you can pitch";
- O meu conto não ter sido um dos dez seleccionados no concurso da Fnac.

Nota para o futuro: fazer mais vezes este tipo de lista para minimizar o peso dos dias e dedicar uma parte do dia a uma parte do corpo, como fazia Dom Rigoberto (já não me lembro se era um cuidado diário, ou semanal). Por exemplo, hoje, dediquei uns bons 7 minutos aos dentes: escovei-os, passei o fio dental, voltei a escovar, bochechei-os com elixir e, mesmo tendo noção que não fazia grande sentido estar a lavar os dentes desta maneira pela manhã, senti-me muito bem.

Eu não guardo o melhor para o fim*

4.7.12
Eu decido arrumar e limpar a casa e arrumo e limpo a casa, mas quando acho que a casa precisa de um jeito começo pela divisão que tem mesmo de ficar arrumada, porque sei que não chego à última  (há sempre outras coisas a meterem-se no meio).
E nunca guardo o melhor para o fim, começo sempre pela parte com creme das bolas de berlim, pelo montinho dos muffins e pelo cone cheio de chocolate dos cornetos.

*O que não quer dizer que tenha algum significado especial, ou faça de mim uma pessoa menos vulgar, como pareço ansiar (pobre de mim).

Loucos de Lisboa

4.7.12
Às vezes o Isaac não vai à escola, como ontem, só porque sim, porque é terça-feira e porque nos apetece. Mas depois de 11 horas metida em casa, com duas crianças pequenas (passear sozinha com os dois - a Beatriz está de férias, na praia, com os avós paternos - costuma ser mais aflitivo do que ficar em casa, ainda que tenda a arriscar, por saber dos benefícios do ar livre), passo a finíssima barreira invisível que separa a sanidade mental da insanidade. Ou, pelo menos, achava que passava, porque depois das tais 11 horas saí para uma caminhada de 45 minutos, com o ipod, e quando me apeteceu dançar (ao som de Beirute, creio), no meio de um jardim cheio de gente, pensei duas vezes. Ainda levantei os braços e dei uma volta, mas não consegui mais do que isso. Não chegarei a ser um desses loucos de Lisboa, portanto.

Julho

3.7.12
O quilt do Verão avança, mais rápido que o da Primavera, mas é capaz de ficar parado mais algum tempo (apesar de ter uma menina à espera dele), porque cheguei àquela fase em que fico deprimida com o resultado.

Julho é uma enorme sala de espera.

E eu brinco com legos e puzzles como se estivesse embrulhada em película aderente. Eles são maravilhosos, os meus filhos, mas eu preciso mesmo de sair daqui.

Dragões

2.7.12
Parte do serão de domingo é, quase sempre, dedicado a esse grande desporto mundial que é o zapping, numa tentativa vã de adiar o mais possível a ida para a cama, como se isso permitisse prolongar um pouco mais o fim-de-semana e adiar o início de mais uma semana igual à que passou, que já foi igual à anterior e por aí fora.
Ora, ontem, depois de Uma Família Muito Moderna, parei ao ouvir falar este senhor e fiquei maravilhada (é que nem os trejeitos da Paula Moura Pinheiro me fizeram querer continuar a dar ao dedo), não só porque a temática da conversa tocava precisamente o maravilhoso, mas por ter descoberto que todos os povos da terra têm um elemento comum nas histórias que foram passando de pais para filhos: o dragão. E o que me deixou espantada não foi estar de frente, mais uma vez, com a conclusão óbvia de que a humanidade bebe da mesma fonte (Platão dizia isto de uma maneira muito mais bonita), o que me deixou espantada foi o dragão. Como é que todos os povos que habitaram este planeta inventaram um ser tão estranho? Não sei porquê, parece-me bem mais fácil acreditar que existiram dragões do que achar que foram fruto da imaginação dos nossos antepassados.