Eu, numa relação bondage?

12.4.11
-Olha, provavelmente vou arrepender-me, porque ambos queremos que estejas em casa o máximo de tempo possível quando nascer o bebé, mas se puderes acho melhor meteres uns dias de férias agora, porque preciso de ti - disse-lhe eu.
-OK, vou ver o que posso fazer - respondeu ele.

E assim, desde ontem, temos o gajo a controlar as coisas em casa; a levar-nos, contrariado, à praia, para que a mais velha se atire ao mar gelado da Caparica, o mais novo coma toda a areia que lhe apeteça e aqui a foca possa andar/rebolar de um lado para o outro, enquanto trauteia "Suor e Fantasia", a imitar o JP Simões, porque a "vida é difícil sempre foi", a ver se o parto se despacha a começar.
Também por isso posso dar-me ao luxo de encostar-me ali no sofá, com o sol a entrar pela janela, de livro na mão a pensar que mais uma vez o "Ulisses", do James Joyce, se impõe na minha vida (depois de tanto ouvir a minha amiga Mrs. Woolf falar do livro) e a tentar encontrar uma razão para isso, como a circularidade das viagens de que fala Vila-Matas, por exemplo, mas a única coisa que me ocorre (e que não tem rigorosamente nada que ver com o livro, acho eu) é que vivo numa relação bondage com o fim da minha gravidez. E eu, que achava que se alguma vez entrasse neste tipo de fetiche seria para dominar, vejo-me completamente dominada pela coisa.
Todos os sinais de que o trabalho de parto está para começar estão presentes e quando começam as contrações (desde domingo que chegam mansinhas e aumentam de intensidade durante duas horas, depois diminuem, depois acabam, depois recomeçam) eu fico à espera de novas indicações a ver se será preciso ligar à babysitter, atenta a todas as sensações, com todos os poros do meu ser a ser controlados por esse poder.
De maneira que agora, pronto, estou para aqui a sentir-me vítima de maus tratos e a achar que mereço, porque na realidade eu não estou ansiosa que o Nicolau nasça. Eu estou é com vontade que a gravidez termine para resolver uma série de coisas práticas que têm de ser resolvidas e isso é muito pouco condizente com todas as coisas bonitas ligadas ao nascimento.

7 comentários:

  1. Atão, Calita, está quase. Ainda não tinha tido oportunidade de vir aqui dizer-to, mas desejo-te uma hora pequenina. E vou ter de ler esse Vila Matas que me está a parecer interessante...

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  2. É muito cansativa, essa espera. Essa expectativa. Possivelmente nenhuma outra sensação do mundo se encaixa tão bem nestas duas palavras (a não ser talvez ver uma pessoa a morrer, mas isso agora não interessa para o caso). Quando as contrações chegarem a sério tu vais perceber que está mesmo na hora e essas coisas práticas que achas que queres resolver vão perder toda a importância, vais ver. Aguenta-te com a espera, que eu espero que esta espera tenha como resultado uma hora bem pequenina como foi a minha.
    Charlote

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  3. Carago, é o terceiro. Haverá alguma coisa bonita num terceiro parto?! Bonito, bonito é levar um bebé, a cheirar a bebé, a arrulhar à bebé para casa depois de deixar no aterro do hospital as membranas, o sangue, o suor, as agulhas, as tiras, os pontos e os agrafos, as mãos enluvadas, as enfermeiras que nos espremem as mamas, as camisas de dormir com botões à frente, o cheiro a anestesia, o nosso pipi macerado.

    Dora

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  4. É de ler Maria David, é de ler.

    Charlote, eu sei que vou identificar as contrações a sério, oh se sei! O problema é elas não chegarem de uma vez e pronto. Mas isto é mesmo assim, já sabemos.

    Oh, Dora, olha que sim, olha que apesar de tudo pode haver coisas bonitas num parto, por mais inverosímel que pareça. E parece, de facto.

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  5. Esta espera é uma seca, eu sei. Mas não há nada a fazer senão esperar. E caminhar e subir escadas, quando a coisa fica mesmo insuportável - eu estava inchada como uma baleia, as minhas pernas pareciam os pneus de camião, mas passei uma semana enfiada nos sapatos do P. (sim, estava mesmo mesmo muito inchada) a fazer caminhadas e a subir as escadas das estações de metro a ver se a coisa acelerava, e acho que resultou. Eu só tive um parto, mas gostava de ter mais, não só pelo bebé como pelo parto. Também acho que o parto pode ser um momento bonito. O meu foi. Foi das sensações mais espetaculares que tive, de tal maneira que me lembro de pensar: se isto é assim, tenho já outro. (o meu pós parto foi muito complicado, mas isso já é outra conversa)

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  6. eu nao sei o que fizeram de mal as camisas de dormir com botoes à frente a tanta gente... tb as tive, eram práticas e absolutamente normalíssimas. tenho a certeza que nao tinham culpa nenhuma no facto de eu me sentir um bidão oco. (nao quero que me revelem o contrário, pf)

    e concordo com a calita. mas tb concordo que há muita porcaria que se dispensa recordar.
    a grande diferença entre nós e a calita está em que a grandessíssima sortuda já fez um parto "normal". ;)

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  7. ah, calita, enquanto esperas, desejo tudo de bem bom para as próximas semanas incríveis que vais ter!

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