Da intimidade, ou da privacidade

17.2.11
Pode ser por estar doente. Por estar grávida. Ou pelas duas coisas. Mas há dias em que isto - a minha vida, não faz sentido nenhum. Passa-se um dia e depois outro, eu prostrada no sofá com a banda sonora do Baby TV, o Isaac a esfregar a escova de dentes no chão, ou a comer a caixa do Ben-u-ron, ou a rasgar livros, e eu a pensar numa forma de sair disto - da minha vida (e agora sou eu a pensar): «A Bea podia ficar com o pai, mas ele não teria como ir buscá-la à escola, levá-la ao conservatório... e como é que ela ia estar com os irmãos? O Jaime tinha de arranjar uma ama para o Isaac, para poder ir trabalhar. E há o Nicolau. Tenho de o parir e amamentar primeiro. Depois posso sair disto. E como é que eu vivia sem eles? E eles sem mim, viveriam melhor? Talvez, talvez...»
E eu a pensar, aqui, em voz alta, é expor-me demasiado. Não tenho quaisquer problemas em mostrar as mamas na praia, ou num bar depois de alguns copos (diz que já aconteceu). Não tenho problemas em mostrar fotos minhas (tirando o facto de não gostar de me ver nelas), ou dos meus, ou de minha casa. Não tenho problemas em arrotar postas de pescada sobre um ou outro assunto. Não sinto a minha privacidade invadida, sinceramente. Agora revelar a voz (ou as vozes) que tenho dentro da minha cabeça, isso é outra história. Abro, hoje, a excepção, porque sou magnânima e é provável que esteja um bocadinho desequilibrada, pelas razões que já referi e porque descobri que a Vírgina Woolf teve um caso amoroso com a Vita Sackeville-West, em 1925 (nem parece meu não saber de uma coisa desta antecipadamente, i.e, antes de começar a ler o Diário dela).

8 comentários:

  1. Sei tão bem como isso é... essa sensação... As alturas em que nos pomos em causa...

    (... e agora escrevo, apago, escrevo, apago... não encontro as palavras certas para comentar...)

    A minha mãe (única pessoa com quem me permito "pensar em voz alta" nesse tipo de dúvidas) diz que é saudável. Que é sinal de que ainda nos preocupamos com o que andamos a fazer. Diz ela que, o contrário é que é um pouco estranho...
    Não sei se é verdade mas... de cada vez que caio nesses momentos auto-analíticos (críticos?) agarro-me a isso.

    Queria dizê-lo melhor mas, não consigo... Só queria dizer que percebo...

    Abraço.

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  2. escova de dentes a esfregar chão ....fantástico !força e sem estar grávida e sem ter filha no conservatório tb tenho dias;) beijos

    joana vieira

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  3. Pareces uma das mulheres do "As horas".

    Dora

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  4. Não vejo nada de anormal nisto. Há dias em que apetece fugir e vêm-nos muitas ideias à cabeça - como seria se fugissemos mesmo é uma delas. Escrever sobre isso só mostra coragem. E ajuda a afastar os fantasmas (os tais que nos vêm à cabeça quando apetece fugir).

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  5. estás no bom caminho, portanto.
    beijos grandes. os teus devaneios fazem sempre as minha delicias!

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  6. Atão não sabias da Gina e da Vita? Isso é verdadeiramente imperdoável!!! O resto há de passar (já aderi ao acordo e não ponho tracinho).
    Eu também tenho os meus dias em que me apetece fugir com o circo. Não havia um filme do Fassbinder sobre uma dedicada esposa novecentista que sonhava com isso? Effie Briest? Com a Hanna Shygulla? Ou estarei a inventar? Também me acontece.

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  7. Pfff, não faço ideia Maria David. Não me lembro de nenhum filme do Fassbinder que tenha visto. E agora vou ali chorar, porque vai-se a ver e sei tão pouco sobre tantas coisas! obrigadinha por me lembrares disso, tá? :)

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