Arejar

31.10.17
No bairro onde estou a viver temporariamente devo ser a única pessoa que deixa janelas abertas durante o dia. Mesmo sendo certo que a maior parte das casas estão vazias, porque os habitantes só as habitam algumas horas por dia, não deixa de ser estranho.
Mas que sei eu? Eu vou na rua e olho para as pessoas que arrastam aqueles sacos de compras com rodas, das lojas dos chineses, e tento perceber se posso ser eu ali, no futuro.
Vejo os desenhos do Nicolau - eu com um chapéu e a cricatriz na testa, três árvores ao vento. Olho para os três dentro do meu telemóvel, o Isaac a falar comigo, só ele fala comigo, o Nicolau não quer e o Jaime escreve-me.
Preferimos escrever a falar ao telefone. Comovo-me com a nossa falta de jeito para estarmos separados. Surpreendo-me com a minha dependência dele.
E com a minha falta de imaginação para cozinhar pratos sem carne, ou peixe para uma vegetariana que adora bifes.
Vou no metro e tento adivinhar o que vai na cabeça de toda aquela gente. O casal com as duas miúdas, por exemplo, no último dia de férias e por isso já a imaginar o regresso à casa nova com muitos quartos, mesmo assim não os suficientes para alguma das crianças não ter de partilhar o dela. Além daquelas duas, há ainda os filhos de um deles que ficaram em Malta.
No Largo peço o prato do dia mas ainda é cedo, "só à 1h é que está pronto", como uma sandes, as mãos ficam besuntadas de azeite e coentros. Sigo para casa, cruzo-me com muitas, muitas pessoas e algumas parecem reparar em mim.
Fiz sopa de grão-de-bico para o jantar mas a vegetariana tem planos para o Halloween, ou Samhain, ou o que quer que se esteja a festejar.

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