Vou fazer aquela coisa absolutamente inconsequente que é defender as pessoas que só conseguem ver o copo meio vazio.
Eu sei, eu sei, são umas pobres coitadas que não sabem aproveitar a vida, que perdem tempo (precioso nesta vida que são dois dias e um já está acabar) a olhar para a metade vazia e mais não sei quê, mas deixem que vos esclareça uma coisa: o copo está efectivamente meio vazio. Se ele estava cheio e foi bebido até meio, ficou meio vazio. Se ele estivesse vazio e fosse enchido até meio, aí sim, poder-se-ia dizer que estava meio cheio. Digo eu, que sou pouca dada a tratados filosóficos, apesar de esse ser um dos meus projectos jamais confessáveis em público, devo admitir.
Mas estou a fugir ao que interessa, que é defender as pessoas que vêem o copo meio vazio. Ora, como generalizar é um dos meus passatempos preferidos, vou, então, numerar algumas características, positivas que bastem, das pessoas referidas:
1) apesar de, regra geral, serem pessoas que adoram falar de si próprias têm perfeita noção de que existem outras pessoas, todas diferentes entre si, no mundo;
2) por isso, nos dias bons, conseguem gostar das pessoas que vêem o copo meio cheio, ao contrário destas que passam a vida a fazerem aquelas sentirem-se montes de esterco;
3) quando são mulheres estão-se a marimbar para o facto da tampa da sanita estar levantada ou baixada, ou para os cabelos que se esqueceram de recolher do gargalo da banheira;
4) estão fartinhas de saber o milagre que é estar vivo, seja porque viram muitos filmes, ou porque lhes morreram pessoas fundamentais, ou porque sabem, ponto, mas isso não as torna cegas em relação ao facto de meio copo ter ido à vida.
5) e quando se riem, quando se comovem, quando agradecem ao universo, ou quando amam fazem-no com a certeza de que é raro o que estão viver, porque sabem, sem margem para dúvidas, que o destino de um copo meio vazio é ficar vazio de vez.
posto isto, não encontro o meu copo!
ResponderEliminarestás a falar de ti :)
ResponderEliminarPrefiro essa perspectiva, por causa do seu imenso pragmatismo e da sua arrepiante poesia. Quando se percebe que metade do copo já se foi, não se perde tempo a estudar como se vai beber a outra metade, sobretudo não se perde tempo. Bebe-se sempre com paixão e com essas coisas todas que referes na alínea 5. Eu gosto especialmente da parte em que se aceita que metade do copo já foi e não volta mais. Essa alegoria não é assim a melhor para explicar a diferença entre optimismo e pessimismo, mas mesmo assim acho que o pessimismo, em doses medicinais, faz muito melhor à saúde mental que o optimismo.
ResponderEliminarPor falar em copo, há que não tempos que não te ofereço um, mas bem cheio. Hás-de cá vir à floresta outra vez.