De grão em grão...

30.10.11
Há coisas novas aqui, mas por via da dúvidas estamos a encher uma garrafa de litro e meio de água, vazia, com moedas de dois euros para a tal viagem.

A minha filha

28.10.11
A minha filha sai de casa, muitas vezes, mal vestida. Eu olho para ela, ela percebe que não aprovo fica à espera que lhe diga alguma coisa e como me limito a revirar os olhos e, às vezes, a suspirar lá vai feliz e contente pelas escadas abaixo (para depois vir escadas acima recolher o que se esqueceu).
A única coisa que não pode fazer é trocar as estações do ano, e a miúda é perita nisso, ou levar os únicos sapatos de saltos que existem aqui em casa (os que eu usei no meu casamento). De resto que se vista como entender, porque pelos vistos quem tem mau gosto sou eu e os gostos não se discutem e o importante é uma pessoa sentir-se bem e mais isto e aquilo.
Além disso, prefere perder tempo a esconder a roupa em montes atrás da cama do que arrumá-la, porque simplesmente não consegue. E eu já a vi tentar, ela não consegue mesmo arrumar coisas. É assustador!
Depois há a comida, os não gosto disto, não gosto daquilo e sei lá eu que mais.
Mas também acontece a minha filha chegar a casa e perguntar-me: "Temos Os Maias?" e eu dizer que "Sim" e ela perguntar se pode lê-lo e eu "Claro". E, pronto, esqueço-me do resto. 

Direitos adquiridos

27.10.11
Eu gosto de livros, ou melhor, eu gosto de ler livros, não preciso de os ter. Durante muitos anos só lia livros emprestados por amigos e bibliotecas.
Não sei se lhe posso chamar vício, mas é um facto que leio como quem fuma cigarros. Acontece-me parar o que estou a fazer para ler uma página, que às vezes fica a meio, como quando temos de apagar o cigarro para entrar no autocarro. Ou, a meio de uma brincadeira com o Isaac, enquanto ele se distrai com alguma coisa, cravo um livro qualquer à estante e começo a ler até ele voltar a exigir a minha atenção.
Curiosamente, ou não, apesar desta minha dependência nunca tinha ido a uma apresentação de um livro até hoje (ontem, já passa da meia-noite).
E o que posso dizer é ainda bem que fui. Ainda bem que fui apesar do insucesso a tirar leite das mamas, apesar do temporal, apesar do trânsito...
É que fiquei de boca aberta com a apresentação que a Hélia Correia fez do Uma Mentira Mil Vezes Repetida (depois do momento constrangedor, apenas para mim, de estar à procura do bloco e da caneta para tirar notas, porque, por momentos, pensei que estava em trabalho) e emocionei-me com o discurso do Marmelo.
Para explicar o milagre de se ter tornado no escritor que é hoje, e depois de falar nos lápis do avô (um senhor pequeno, careca e alentejano de Castelo de Vide, que só sabia escrever o nome dele), disse que isso só foi possível graças ao ensino público. E lembrou que poder ir à escola até aos 18 anos deve ser um direito de todos.

Cenas da vida familiar

24.10.11
Cena 6
Personagens: Toda a família
Cenário: Quarto

Os pais estão deitados na cama. O bebé, no berço ao lado, acorda. A mãe levanta-se, pega no bebé, deita-o no meio da cama e dá-lhe a mama. Algum tempo depois ouve o mais velho chamar pelo pai. Olha para o bebé, que entretanto deixou a mama e dorme, e sacode o pai.

Mãe: O Isaac está a chamar por ti.

O pai levanta-se e vai ter com o filho.

Filho: Nãaaaao pai, vai-te embora.

O pai volta para o quarto, pega no bebé, põe-no no berço e deita-se. O bebé acorda. A mãe põe-lhe a chupeta. Deita-se. A filha entra no quarto.

Filha: Mamã, não consigo dormir.
Mãe: Vai beber um copo de leite e deita-te.
Filha: Não me apetece.
Mãe: Então e o que queres que te faça? Aqui não tens como dormir. Vai para a tua cama.
Filha: Vens-me deitar?

A mãe levanta-se a bufar e sai do quarto. Quando volta o bebé está acordado. Vê as horas. São 5h10. Pega no bebé, deita-o ao lado dela e dá-lhe a mama. A filha volta a entrar no quarto.

Filha: mamã sabes aquelas ondas que se vêem quando está calor? Eu estou a ver assim do olho esquerdo.

A mãe mete as mão à cabeça.

Mãe: Mas tu só podes estar a brincar comigo. Queres fazer o favor de ir dormir.
Filha: Vens-me deitar?
Mãe: NÃO.

O bebé larga a mama e começa a palrar. O pai levanta-se.

Pai: Anda,Beatriz, eu levo-te lá cima.

A mãe põe a chupeta no bebé. O pai regressa ao quarto, deita-se e adormece. A mãe passa o bebé para o meio da cama e vai-lhe pondo a chupeta até às 6h da manhã, hora a que o mais velho acorda.

Olá Outono!

24.10.11

Ainda bem que me despedi em grande do Verão, no fim-de-semana passado, num piquenique no Parque da Cidade. À custa disso, ao ouvir-me cantar "Fui ao jardim da Celeste", o miúdo disse "E eu fui ao Parque da Cidade".Obrigada amigas pela companhia e obrigada pelas fotos Dora.

Coisas simples

23.10.11


Ao preparar umas camisas velhas para transformar em almofadas olhei para os punhos e vi porta-guardanapos. É tão simples que é impossível alguém não se ter lembrado disto antes. Eu só os cortei e preguei botões de cores diferentes. Estou deliciada!

Primeira vez

22.10.11



A uma semana de completar os seis meses come pela primeira outra coisa que não leite da mãe. Acho que gostou da sopa que o pai fez.

Do entusiasmo

19.10.11
Eu tenho-me, quase sempre, em pouca conta, mas compenso isso nas, mais ou menos, raras vezes em que me dou tal importância que chego ao cume mais alto da auto-estima. Aconteceu-me há pouco quando terminava  O Filho de Mil Homens e fixei-me na frase "Aos quarenta anos, o Crisóstomo, com o seu inusitado entusiasmo, mudou o mundo." Eu tenho quase quarenta anos, mas falta-me o entusiasmo, pensei. Sou como o Riba, do Dublinesca, cujo avô frisava a importância do entusiasmo. É claro que não descansei enquanto não encontrei a frase. Peguei no livro com a certeza de que estava numa página par, no último ou penúltimo parágrafo. E, para confirmar a minha genialidade, lá estava ela na página 114, no penúltimo parágrafo: "Sem entusiasmo, nunca se faz nada de importante".

Ditos populares (ou outras teorias que não têm servidouro nenhum)

19.10.11
A compostagem fede, mas os vasos estão-se a compor. Diz que é mesmo assim: para se chegar a algum sítio é preciso levar com o cheiro. Se não é isso é alguma coisa parecida.

Teoria da infelicidade

18.10.11
Há quem ache que merece ser infeliz. Há quem queira ser infeliz. E há os que esperam dessa forma ser poupados à verdadeira infelicidade. Se já formos infelizes não nos acontecem infelicidades.

Meia

12.10.11

Meia, originally uploaded by panados e arroz de tomate.
Esta coisa do tricot e da costura, se formos a ver bem, tem muito mais de filosofia do que lavor. Fazer meias, por exemplo, tem tudo a ver com a minha própria vida: é das coisas que mais gosto de tricotar e a que não há meio de fazer bem feito. Farto-me de ver meias por essa internet fora, cada umas mais lindas que as outras, e eu, que já vou no terceiro par, vejo as minhas tortas, mal medidas (bom, ninguém me mandou fazer a coisa a olho, tipo profissional) e a notar-se as malhas no cruzamento das agulhas.
Na minha vida é igual: onde sou melhor sucedida (ainda assim, sabe Deus) é a fazer aquilo que eu menos gosto: estar em casa.

Só eu

12.10.11
Isto é tudo muito bonito mas chega. Quero ir ao cinema. Quero ir ao café e ler o jornal sem pressa. Quero ir cortar o cabelo sem precisar de concertar horários com milhares de pessoas (e pensando duas vezes talvez seja melhor deixar o cabelo como está). Quero ter amigos. Quero embebedar-me. Quero ir ao Teatro Camões ver ballet. Quero falar de mim sem ser para um monitor. Quero conversar foda-se! Quero ir para um quarto de hotel com duas caixas de preservativos. Quero ignorar o frigorífico, a despensa e o fogão. Quero ser só eu, por um breve instante.

A primeira encomenda

10.10.11

Cenas da vida familiar

10.10.11
Cena 5

Personagens: mãe e bebé
Cenário: Sala

A mãe está sentada no sofá a amamentar o bebé enquanto conversam os dois:

Mãe: Não sei, mas eu não o faço só porque a OMS diz que é melhor, sabes? Eu também acho que o leite da mãe é suficiente, por enquanto.

Mãe: Oh, sei lá. Para mim vocês só estão bem a mamar. E sempre é uma coisa que se faz sentada, ou deitada. É melhor, ainda assim, do que andar aí a embalar-te de um lado para o outro.

Mãe: Eu também gosto e o teu irmão adora. Mas não vou andar o dia todo na rua, contigo no sling e o Isaac pela mão. Ele também é pequenino e pede muitas vezes colo.

Mãe: Já sabes que cada vez que saímos de carrinho apetece-me desfazê-lo em cima dos carros estacionado no passeio, ou atirá-lo contra uma parede quando os passeios não existem, ou estão cheios de buracos...e, como deves imaginar, não posso fazer isso porque o carrinho é da Luísa e quando ela voltar da viagem à volta do mundo vai precisar dele.

Mãe: Porque não temos coragem e porque a Beatriz não pode faltar à escola.

Mãe: Não, chateia-me eu estar a fazer exactamente aquilo que escolhi fazer e, para variar, achar que devia  fazer outra coisa qualquer.

Mãe: Oh, sei lá. Cala-te e come, mas é. Dói-me o cérebro.

O livro inventado

7.10.11
Têm-se dito coisas elogiosas do novo livro do Marmelo, do coiso como ele lhe chama, e eu fico muito contente não só porque me parece que está mais do que na altura do moço sair da sombra e vir para a televisão e jornais mostrar a focinheira, mas também porque gosto de me saber em sintonia com as críticas que li.
Depois do último livro do escritor, As Sereias do Mindelo , lembro-me de pensar que o moço estava a apurar a escrita, que andava ali às voltas do buraco negro que é a literatura do ponto de vista de quem escreve, acho eu. E desta vez lá se decidiu a mergulhar de cabeça. O resultado é um livro inteligente, com histórias bem contadas e a fazerem meditar sobre a literatura e a humanidade.
Eu confesso que, além do grande interesse das referências literárias e das personagens inventadas pelo escritor inventado, o que mais me me chamou a atenção em Uma Mentira Mil Vezes Repetida foi aquela coisa do  narrador querer tornar-se um homem célebre por causa de um livro que ele inventou mas não escreveu. Como se escrevê-lo pudesse ser a sua ruína em vez da salvação que ele acredita poder encontrar na celebridade. É por isso que, ao contrário do que se diz, a história de amor não me parece forçada, mas percebo que outro desenlace pudesse ser mais apropriado ao romance.

Uma Mentira Mil Vezes Repetida, Manuel Jorge Marmelo, Quetzal,  2011

Passo demasiado tempo em casa

7.10.11
Eu sei que os meus filhos são de uma beleza, inteligência e sensibilidade incomparáveis, mas tantas vezes olho para eles e vejo uma miúda que atordoa de tão fútil, um puto obsessivo compulsivo e um bebé...bom, o bebé ainda é só um bebé, que acredito ter problemas sérios.
Acresce o facto de estar convencida que tenho fantasmas em casa.

Turistas

6.10.11

Férias sem sair de casa? há montes de boas razões para o fazer, como a crise, o não haver férias escolares nesta altura, uma semana não dar para muita coisa, etc., mas na prática acho é que estamos cansados e com pouca paciência para a logística sair-de-casa-com-tanta-gente. Vai daí, decidimos ser turistas em Lisboa e procurar conhecer/fazer coisas pela primeira vez na cidade onde vivemos. O resultado foi:

- passeio no Yellow Bus (Lisboa fica a perder, e muito, vista de cima de um autocarro)
- subir a Bica no ascensor (com o senhor de 94 anos que já foi operado ao coração, à anca e aos dois olhos)
- descer no elevador de Santa Justa (com dezenas de turistas)
- subir no elevador da Glória (e agora todos: Desde este lugar sem história/Até um lugar na história/Vão apenas dois minutos/ No elevador da Glória. No elevador da Glória/ No elevador da Glória/ No elevador da Glória)
- espreitar as Ruínas do Carmo enquanto canta o coro da Carris.
- subir a Torre de Belém (bastante impressionante, sim senhora!)
- visitar o Panteão Nacional (um belo de um edifício)
- brincar na Quinta das Conchas (uma maravilha de um jardim)
- e quase que conseguíamos ir ao MAP se não tivéssemos escolhido o dia em que está fechado (terça-feira).

Pelo meio, fomos repetindo coisas como os gelados na Artisani a limonada no Clara Clara e as compras na Retrosaria. Além disso, ainda houve tempo para umas pequenas arrumações aqui em casa que resultaram numa parede inteira, forrada a flanela, só para mim (quem faz mantas de retalhos sabe o que isso significa).

Coisas boas de Lisboa 8

3.10.11
Alguns emplastros, e descanso q.b, depois voltei às corridas. Como tinha tempo, em vez de ir a correr e voltar a correr, corri tudo no jardim e fiz os alongamentos em cima da relva. No fim deitei-me a olhar para o céu pelas frinchas dos ramos da palmeira e estava num misto de relaxamento e alegria imensa (que não há outra forma de estar num Verão em pleno Outubro, sobretudo com os circuitos da serotonina a funcionarem depois da estafa) quando reparo numa pomba. Estava mesmo em cima da minha cabeça, pronta para cagar-me nos olhos. Mas não o fez. No Porto acontecia-me com frequência levar com merda de pássaros. Aqui ainda não aconteceu uma única vez.